A chegada de um novo ano traz sempre consigo uma energia simbólica difícil de ignorar. É como se o calendário nos oferecesse, de propósito, um intervalo estratégico para respirar fundo, olhar para dentro e redefinir o rumo. No ambiente corporativo, e particularmente em Angola, onde a dinâmica económica exige respostas céleres e adaptativas, este período não deve ser apenas uma transição de calendário, mas sim o estímulo ideal para planear e executar uma reengenharia estratégica que impulsione o crescimento e a competitividade das nossas empresas.
Após duas décadas a acompanhar de perto os desafios do sector financeiro, observei que a chave para a longevidade e o crescimento sustentável de uma empresa no sector financeiro, reside na capacidade de abraçar a inovação e a mudança não como opções, mas como imperativos de sobrevivência. Aproveitar este novo ciclo exige uma abordagem estruturada focada em três pilares: a mudança de mentalidade, a adopção estratégica de tecnologia como a Inteligência Artificial e o investimento incondicional no capital humano.
No contexto angolano, com os seus desafios estruturais e a sua inegável riqueza de potencial, exige que os nossos líderes e gestores se desprendam de modelos obsoletos. A competitividade do futuro não será definida pela dimensão do capital ou pela antiguidade no mercado, mas sim pela agilidade com que as empresas conseguem implementar inovações que realmente impulsionem o crescimento e a eficiência.
Muitas vezes, a palavra inovação é mal interpretada, sendo reduzida a meras aquisições tecnológicas. No entanto, a verdadeira inovação corporativa é muito mais profunda; ela é uma mudança de mindset, uma predisposição para questionar o status quo e reformular processos, produtos e, principalmente, a cultura organizacional.
Em Angola, onde a digitalização avança a passos firmes, mas desiguais, o Ano Novo apresenta uma oportunidade de ouro. É o momento de ir além da simples digitalização de documentos e pensar na digitalização da experiência do cliente. Para o sector bancário, isto significa lançar novas ferramentas tecnológicas ou sistemas de atendimento ao cliente que tornem os serviços mais intuitivos e melhorem a inclusão financeira, resultando numa maior taxa de bancarização.
É completamente impossível nos dias de hoje pensar em inovação sem falar da Inteligência Artificial (IA), sobretudo no sector financeiro, onde a IA é um incentivo a inovação, oferecendo vantagens transformadoras.
Para o sector bancário, por exemplo, a IA oferece vantagens que revolucionam e geram grande impacto no crescimento e na competitividade:
- Melhoria na Análise de Risco: Avaliações de crédito e de risco operacional mais precisas, rápidas e em tempo real, reduzindo perdas e acelerando a concessão de crédito.
- Optimização da Eficiência: Automatização de tarefas repetitivas, reduzindo custos operacionais, libertando quadros para funções mais estratégicas e de contacto humano.
- Inclusão Financeira: Criação de chatbots e sistemas de atendimento que tornam os serviços mais acessíveis, mesmo em áreas com menor presença física.
Estamos diante de uma IA que deverá contribuir com mais de USD 15,7 trilhões para a economia global até 2030, segundo a Havard Business Publishing. Uma Inteligência com grandes indicadores de adesão, com 54% de executivos a afirmarem que as suas soluções aumentam a produtividade das suas empresas, segundo a PWC.
No entanto, o uso deste fenómeno tecnológico carrega um risco subtil, mas grave, que observamos disseminar-se no ambiente de trabalho, face à sua utilização descontrolada.
Assistimos a uma perigosa tendência onde profissionais, de diversos níveis e áreas, delegam à IA a escrita de e-mails cruciais até a análise e elaboração de documentos complexos e estratégicos, que exigem pensamento lógico, maturidade e profundo conhecimento do contexto organizacional e do país, descurando o esforço intelectual e a capacidade de análise.
“É importante deixar bem claro que a IA é um auxílio; não pode ser um substituto para o pensamento crítico, a experiência acumulada e o profundo conhecimento do nosso mercado.”
O verdadeiro perigo reside em confundir a ferramenta de IA com o “mestre que tudo sabe, e tudo faz”. É importante deixar bem claro que a IA é um auxílio; não pode ser um substituto para o pensamento crítico, a experiência acumulada e o profundo conhecimento do nosso mercado. Um artigo de opinião, por exemplo, deve reflectir a alma e a vivência do autor, algo que nenhuma máquina pode replicar na sua essência e paixão sobre o tema.
Para reduzir o Risco da utilização indevida da Inteligência Artificial é preciso:
- Estabelecer Directrizes de Uso: Implemente um Código de Conduta Interno que defina quais tarefas não podem ser totalmente delegadas à IA (ex.: análise e elaboração de documentos complexos, decisões críticas e estratégicas de gestão).
- Priorizar o Pensamento Crítico: O investimento em inovação deve ser cultural antes de ser tecnológico. Os líderes devem encorajar a equipa a usar a IA para dar suporte ao trabalho, e não para o substituir, garantindo que o esforço intelectual e a contextualização angolana do tema são mantidos.
O exercício contínuo de gestão demostra que as grandes transformações só vingam quando a equipa é envolvida desde o início. Os nossos colaboradores são o principal activo e o maior motor de ideias frescas.
O investimento no capital humano é, por outro lado, o alicerce fundamental. Recomendo que, neste novo ciclo, as empresas em Angola façam um esforço concertado para mapear as competências futuras e investir massivamente na requalificação dos seus colaboradores. Não podemos esperar que as inovações venham de fora; temos de cultivá-las dentro da empresa.
O novo ciclo que se inicia é ideal para quebrar a dicotomia entre o respeito pelos métodos tradicionais e a disrupção imposta pelo mercado global. Não se trata de abandonar o que é bom, mas de melhorar o que já existe com ferramentas modernas.
A solidez e a ética são inegociáveis. Porém, a solidez só se manterá se for acompanhada de agilidade. As empresas angolanas precisam de criar estruturas mais leves, menos burocráticas, onde as decisões sejam tomadas mais perto da acção. Isto exige a descentralização da liderança e a capacitação dos quadros intermédios. O líder deve-se assumir como um facilitador, um mentor e um gestor de expectativas, criando um ambiente onde a falha é vista como uma lição aprendida e não como um motivo de repreensão.
O Ano Novo é, na prática, uma folha em branco para as nossas empresas. É o momento certo para começarmos a construir um futuro de maior sucesso e competitividade para os negócios em Angola. A nossa experiência em lidar com riscos e mudanças, permite-nos afirmar que: o maior perigo que enfrentamos é ficar parados e não fazer nada. O grande crescimento e os resultados acima da média são reservados apenas àqueles que têm a coragem de ousar em mudar os seus modelos de negócio.
Que este período de transição seja aproveitado para uma introspecção rigorosa. Que as nossas empresas e os seus líderes se consciencializem de que a mudança deve ser planeada e executada com coragem e visão estratégica.
Para reflexão, proponho as seguintes três questões:
- Não estamos a confundir gastar em tecnologia com investir em inovação?
- A inovação é um processo cultural antes de ser um investimento em hardware ou software?
- Que passo concreto a sua empresa dará, já no início de ano que se avizinha, para se tornar um exemplo de inovação?




