A liderar um grupo chamado… Nice

No mundo empresarial, há histórias que inspiram e líderes cuja visão e dedicação moldam o caminho para o sucesso. É o caso de Eunice Mascarenhas Monteiro, cuja veia empreendedora e de empresária está também a contribuir para o desenvolvimento socioeconómico de Cabo Verde. Com formação em gestão e um mestrado pela Universidade Nova de Lisboa,…
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Nice de Eunice Monteiro, uma mulher que personifica o espírito empreendedor e cujas realizações não só marcam a sua carreira, mas também contribuem para o desenvolvimento socioeconómico de cabo verde.
Negócios

No mundo empresarial, há histórias que inspiram e líderes cuja visão e dedicação moldam o caminho para o sucesso. É o caso de Eunice Mascarenhas Monteiro, cuja veia empreendedora e de empresária está também a contribuir para o desenvolvimento socioeconómico de Cabo Verde.

Com formação em gestão e um mestrado pela Universidade Nova de Lisboa, a cabo-verdiana começou a sua carreira no Ministério da Justiça e Defesa, marcando o início de uma jornada dedicada ao serviço público. Em entrevista à Forbes África Lusófona, conta como começou o percurso e a forma como transforma problemas em soluções.

Eunice Mascarenhas Monteiro lembra que foi já em Cabo Verde, depois de completar a licenciatura em Portugal, que o sentido empresarial ganhou destaque. “O ponto de partida foi em 2005, quando investidores voltaram as suas atenções para Cabo Verde. As ilhas tornaram-se um terreno fértil para iniciativas que visavam proporcionar respostas tangíveis aos problemas enfrentados pelos estudantes”, salienta.

Foi nessa altura que a empresária arregaçou mangas e avançou com o seu primeiro investimento, com recurso a empréstimo bancário, depois de ter ganho, nesse ano, o concurso para exploração das três áreas de alimentação do novo aeroporto da Praia. A gestora recorda: “Inconformadas com a imagem obsoleta que o sector da restauração em Cabo Verde tinha, na altura, recorremos ao empréstimo bancário e decidimos investir, aproximadamente, 100 mil euros, inovando completamente o sector da restauração na capital, nivelando para cima a imagem e o perfil dos colaboradores para o nível pós-secundário, servindo, assim, de farol para os novos investidores que passaram, doravante, a emergir na ilha de Santiago.”

Mas a pedra-de-toque aconteceu primeiro em 2003 e impulsionou ainda mais esta veia empreendedora. A ideia de criar as quatro empresas que detém começou a ganhar forma quando Eunice enfrentou o desafio de trazer uma marca internacional de fast food para o país que a viu nascer. “Em 2003, quando quis, através de franchising, trazer para Cabo Verde uma marca de fast food de referência internacional, a McDonald’s, fui confrontada com a nossa triste realidade: a exiguidade populacional, que impede a atracção e a operação de uma marca-âncora desta envergadura”, recorda a gestora.

A estratégia de Eunice Mascarenhas foi então de apostar num segmento muito avançado para a época, com a qual diz ter conquistado muita aprendizagem. Perante as limitações populacionais, a empresária e a mulher de um colega de projecto decidiram, na altura, criar a Nice-Burger. O negócio não só inovou o sector de restauração, mas também serviu como embrião para a formação do Nice’s Group, que engloba agora marcas como Nice Cachito, NiceUnivercitY, Nice Press, Nice Kriola e Nice Prestige.

Em paralelo com as empresas dos sectores da restauração e hotelaria, apostou também, com outros parceiros, na Universidade de Santiago, de que é sócia. Para a empresária, a aposta no investimento empresarial em soluções educacionais em Portugal, tendo como ponto de partida Cabo Verde, revela um compromisso com a excelência académica, mas também uma preocupação genuína em contribuir para uma experiência educacional mais completa e enriquecedora para os estudantes. Admite que vê neste caminho uma promissora colaboração entre o sector empresarial e a educação, visando preparar as gerações futuras para os desafios do mundo em constante evolução.

Mas a gestora não se ficou por aqui. Em 2006, incentivada pelo marido, deu início à sua incursão no sector do turismo, com a inauguração do Nice-Prestige Boutique Hotel, inaugurado na Assomada, projecto que segundo a própria reflecte não apenas um empreendimento, mas um conceito turístico inovador que actua sob o lema ‘Por um turismo diferente’. E é com orgulho que sublinha: “A marca Nice provém do meu nome, Eunice.”

Vencer os desafios

Quanto aos desafios que tem encontrado, não esconde que tem sido, ao longo destas mais de duas décadas, enfrentar a incompreensão política sobre a necessidade de antecipar o desenvolvimento turístico em Santiago. Reitera a urgência de explorar os recursos autênticos de Cabo Verde, como uma vantagem competitiva única, afirmando que a verdadeira oportunidade reside na essência do povo cabo-verdiano.

“O nosso grupo empresarial, tal como os estudos científicos vêm revelando, entende que o turismo cabo-verdiano deverá, incontornavelmente, passar por uma oferta estratégica de novos produtos turísticos, baseados na essência do homem cabo-verdiano, ao invés do monoproduto de ‘sol e praia’”, sublinha.

A empreendedora afirma que a inovação e a tecnologia sempre estiveram na vanguarda dos seus empreendimentos. A introdução de tecnologias de ponta, música ambiente, exposições artísticas e o compromisso com práticas sustentáveis mostram que os seus negócios não apenas prosperam, mas abraçam o futuro de forma responsável.

Mas garante que não se vai ficar por aqui. Apostar numa nova oferta turística, virada para os nómadas digitais profissionais, bem como a globalização da tradição de Cabo Verde para cativar a diáspora, constituem os grandes desafios que Eunice Mascarenhas ainda pretende abraçar.

“As nossas empresas têm apostado no segmento nacional, residentes ou não, mas o nosso desafio de hoje é chegar ao mercado emissor de turistas, na tentativa de superar as suas expectativas”, projecta.

Num compromisso firme com a sustentabilidade, a empresária começa a embarcar em novos projectos que não apenas aproveitam, mas transformam também os recursos estratégicos renováveis do arquipélago lusófono: o mar, o sol e o vento.

Perante o facto de a abundância de recursos marinhos em Cabo Verde ainda ser um activo pouco explorado, Eunice pretende apostar em iniciativas para capturar e transformar a riqueza vinda do mar. Admite que projectos de aquicultura sustentável e tecnologias inovadoras de energia das ondas estão no horizonte, promovendo a utilização responsável dos recursos marinhos e contribuindo para a segurança alimentar e energética.

“A energia solar não só reduzirá a pegada de carbono, mas também posicionará Cabo Verde como um líder em energias renováveis.”

A empreendedora está também empenhada em aproveitar ao máximo o recurso solar. Por isso, estão em curso investimentos significativos em infra-estrutura de energia solar, visando não apenas a auto-suficiência energética, mas também a exportação de energia limpa para a rede nacional. “A energia solar não só reduzirá a pegada de carbono, mas também posicionará Cabo Verde como um líder em energias renováveis. Estamos a criar planos para implementação de parques eólicos modernos e eficientes, contribuindo para a diversificação da matriz energética e garantindo um futuro mais sustentável”, revela.

À medida que a empresária avança em direcção a uma nova era de sustentabilidade, a sua visão é clara: transformar os recursos naturais de Cabo Verde em motores de crescimento económico, preservação ambiental e avanço tecnológico. Esses projectos afirmam o compromisso da empresa com a sustentabilidade, mas também sinalizam uma mudança positiva rumo a um futuro mais verde e próspero para o país e não só.

Como todos os empresários, Eunice Mascarenhas enfrentou desafios inesperados, sobretudo durante a pandemia de covid-19. O pânico inicial deu lugar à resiliência. A empresária e a sua equipa reinventaram operações, introduziram serviços como o takeaway e aproveitaram os apoios do Governo e o apoio significativo da diáspora cabo-verdiana.

“A pandemia de covid-19 foi uma prova viva disso. Foi profundo, mas paulatinamente estamos a reerguer-nos, com mais capacidade de resiliência. Tenho comigo uma frase sempre presente do Albert Einstein: ‘o que não nos desafia não nos transforma’. Daí que o desafio é ir encontrando soluções para cada situação que  surge”, frisa.

Na liderança associativa

A paixão pelo sector empresarial levou-a a estar rodeada de outros empresários e mulheres que considera mais experientes e mais fortes com quem afirma aprender a cada dia.

Eunice Mascarenhas enveredou também pelo associativismo, onde vem exercendo cargos de liderança. Liderou, desde 2012, a Associação de Mulheres Empresárias de Cabo Verde, tendo contribuído para que a instituição ganhasse notoriedade. Em simultâneo, foi convidada e faz parte de organizações da sociedade civil para o sector empresarial, como vice-presidente da Câmara de Turismo de Cabo Verde e embaixadora da WEB, uma rede de empreendedorismo, sediada em Nova Iorque, que tem como propósito impulsionar o empreendedorismo feminino pelo mundo. Eunice é também, actualmente, vice-presidente da Federação de Mulheres Empresárias da CPLP.

O percurso de Eunice Mascarenhas inclui também a liderança em iniciativas essenciais como o acesso ao ensino superior em Cabo Verde e a criação da primeira universidade privada no país.

Entretanto tem recebido o reconhecimento internacional, em que se destaca o prémio de Mulher Empresária em Espanha/Canárias e a inclusão na lista das 100 personalidades mais influentes da África Lusófona, pela African Shapers. “Estive ligada também ao sector da formação profissional e ao fundo para esse fim, bem como ao processo para a criação da escola de hotelaria de Cabo Verde, que, inicialmente, estava a ser projectada para a ilha do Sal, no antigo Hotel Atlântico”, salienta.

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