A fazer caminho no sector da cosmética em Londres

A guineense Vanessa Fernandes é um exemplo de determinação, resiliência e visão. O seu percurso profissional é uma narrativa de superação que passa por diversas áreas: da comunicação à moda, do jornalismo ao empreendedorismo, consolidando-se como uma referência na indústria de cosméticos e de beleza. Empreendedora visionária e activista pela educação feminina, combina luxo e…
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De estagiária na BBC a figura de impacto no sector dos cosméticos em Londres, a guineense Vanessa Fernandes transformou desafios em oportunidades e construiu um negócio que alcançou um volume superior a meio milhão de libras em 2024.
Negócios

A guineense Vanessa Fernandes é um exemplo de determinação, resiliência e visão. O seu percurso profissional é uma narrativa de superação que passa por diversas áreas: da comunicação à moda, do jornalismo ao empreendedorismo, consolidando-se como uma referência na indústria de cosméticos e de beleza.

Empreendedora visionária e activista pela educação feminina, combina luxo e impacto social, com planos ambiciosos para 2025, em que se destaca expandir o seu negócio aos seis países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP), lançar uma linha própria de cosméticos e capacitar mulheres a nível global. Vanessa é uma activista incansável pela educação das raparigas em comunidades desfavorecidas.

Hoje, tornou-se numa empresária bem-sucedida. Depois de ter começado a empreender contava 19 anos, hoje lidera um negócio de distribuição de produtos cosméticos e gere clínicas de estética de luxo em Londres. No entanto, o início da sua caminhada foi tão modesto quanto inspirador. Em conversa com a Forbes África Lusófona, Vanessa partilha os desafios, as conquistas e as motivações que moldaram sua trajetória.

A jovem que a Guiné-Bissau viu nascer iniciou a sua carreira como estagiária na BBC World África Lusófona, mas desde cedo percebeu que o empreendedorismo estava no seu ADN. “Desde criança, quando penso nas minhas brincadeiras, percebi que sempre estavam relacionadas com criar algo ou vender. É algo que me acompanhou desde muito nova”, revela.

Ainda na universidade, enquanto estudava moda, Vanessa descobriu a sua paixão pela comunicação. “Uma das disciplinas do curso era Comunicação de Moda, e eu percebi que era melhor a falar sobre moda do que a fazer roupas”, recorda. Este interesse levou-a a fazer um mestrado em Comunicação para Moda, onde combinava jornalismo, marketing e relações públicas.

Depois de concluir o estágio na BBC, aventurou-se no mundo das relações públicas, trabalhando para uma empresa de moda em Londres. Foi esta experiência que lhe deu as bases para uma transição inesperada para o mundo do empreendedorismo. “Essa habilidade veio da minha infância, marcada pela guerra civil na Guiné-Bissau, onde, com apenas 11 anos, tive de cuidar das minhas irmãs mais novas. Essa experiência tornou-me uma líder com muito foco”, afirma.

Vanessa explica que trabalhar como estagiária em Londres não era suficiente para manter o seu estilo de vida. Foi aí que terá percebido que conseguia criar algo próprio. A ideia surgiu da escassez de produtos para cabelos afro em salões de beleza de Londres, uma cidade cosmopolita.

Conhecendo as marcas brasileiras de alta qualidade disponíveis em Portugal, a jovem empreendedora começou a importar produtos em pequena escala. “Pedi emprestadas 1000 libras à minha tia para comprar os primeiros produtos e imprimir cartões de visita”, conta. Vanessa começou então a visitar salões no centro de Londres, oferecendo amostras e criou uma rede de clientes.

“A mulher negra é uma grande consumidora da indústria de luxo, mas raramente a vemos a liderar negócios desse sector. Sinto que tenho de mudar essa narrativa.”

A aposta inicial foi arriscada, mas estratégica. “Escolhi os salões no centro de Londres porque sabia que tinham maior capacidade de compra”, justifica. O resultado foi positivo, os clientes começaram a ligar a solicitar mais produtos.

O início não foi fácil, Vanessa não tinha experiência formal em cabeleireiro ou gestão, mas compensava com determinação e paixão. “Comecei do zero, mas aprendi com cada erro. As margens eram boas, e isso me permitiu reinvestir no negócio”, indica.

Com o aumento da procura, Vanessa passou a comprar directamente do Brasil, aproveitando a diferença cambial entre a libra e o real. Aos 21 anos, abriu a sua primeira loja física. Pouco depois, participou numa feira internacional no Dubai, expandindo a sua rede de clientes para fora do Reino Unido. “Essa experiência abriu-me os olhos para as possibilidades internacionais, porque até então pensei no meu negócio apenas para Londres, mas apercebi-me de que havia um mercado global à minha espera”, afirma.

Hoje, Vanessa lidera uma equipa de várias mulheres na sua empresa. “O meu estilo de liderança é focado na resolução de problemas, gosto de estar envolvida e de inspirar a minha equipa para fazer o mesmo”, sublinha. A sua abordagem colaborativa reflecte-se no sucesso do negócio, onde já acumulou quase 2000 clientes na clínica e fornece produtos a mais de 750 salões em Londres.

Para a jovem, ser uma mulher negra a liderar um negócio numa das zonas mais caras de Londres é também um acto de representatividade. “A mulher negra é uma grande consumidora da indústria de luxo, mas raramente vemos mulheres negras a liderar negócios nesse sector. Sinto que tenho a responsabilidade de mudar essa narrativa”, realça.

A aposta de Vanessa Fernandes agora está em expandir os seus horizontes para os PALOP. Diz ter visitado recentemente Angola e que ficou impressionada com o espírito empreendedor das jovens mulheres que conheceu. “Há uma energia incrível em Angola, as pessoas têm muita vontade de fazer mais, mas precisam de apoio. Tenho planos de lançar um projecto de formação em empreendedorismo, especialmente voltada para mulheres e jovens”, avança. Vanessa pretende partilhar a sua experiência, não só na indústria de beleza, mas também em áreas diversas, através de parcerias estratégicas com organizações locais.

Na Guiné-Bissau, de onde é originária, desde 2016 que apoia uma escola para meninas e é líder de um projecto da organização não governamental World Vision, que promove a educação e a independência financeira de mulheres em 96 países.

Apostar na parceria com marcas de impacto

No sector de cosméticos, Vanessa aposta na parceria com marcas históricas e de impacto social positivo. “Trabalho com uma marca do Gana que utiliza ingredientes naturais africanos, como manteiga de carité e óleo de coco. É importante apoiar empreendedores negros e criar oportunidades tanto na diáspora como no continente africano”, advoga.

Para Vanessa, o sucesso do negócio vai além dos números. No ano passado, revela, terá investido 230 mil libras no negócio, tendo gerado 320 mil libras em vendas. Mas, mais do que o lucro, para a empresária guineense, o que mais importa é ver o seu trabalho deixar um legado para as comunidades onde actua.

Entre os momentos mais marcantes da sua carreira, fica marcado Julho de 2024, altura em que recebeu o título de Liberdade da Cidade de Londres. “Cheguei a Londres com 13 anos, sem falar a língua e sem conhecer ninguém. Receber este reconhecimento como a primeira luso-africana é algo que me emociona profundamente”, indica orgulhosa e com alguma emoção à mistura. Vanessa vê este prémio como uma prova de que é possível alcançar grandes feitos, mesmo partindo do zero. “Espero que a minha história inspire outras mulheres, especialmente as dos PALOP, a acreditarem no seu potencial e a lutarem pelos seus sonhos”, augura.

Em jeito de balanço e já no fim da conversa com a Forbes, a empresária adianta que o ano de 2024 representou “um marco significativo” no seu percurso . Apesar dos desafios enfrentados, impostos pelas incertezas da economia mundial, a sua empresa terá atingido um volume de negócios de 520 mil libras, um crescimento de 60% em relação a 2023, uma ascensão impulsionada pela expansão da clínica de estética e pela entrada de novos produtos exclusivos no mercado britânico e internacional.

“Em 2024, investimos fortemente em infra-estruturas e na formação da equipa. Expandimos a clínica, adicionando novos serviços que rapidamente se tornaram populares entre os nossos clientes. Além disso, conseguimos estabelecer parcerias sólidas com marcas africanas e brasileiras, aumentando o nosso portefólio e a nossa substituição no mercado”, destaca.

Para 2025, Vanessa tem objectivos ainda mais ambiciosos. A empresária planeia aumentar o volume de negócios em pelo menos 40%, ultrapassando a marca das 700 mil libras. Uma parte dessa estratégia passa por fortalecer a presença nos PALOP, com Angola e Cabo Verde entre os mercados prioritários.

“Já temos negociações para abrir representações em Luanda e na Cidade da Praia. Estes mercados têm um enorme potencial, e queremos ser os primeiros a oferecer produtos e serviços de qualidade com uma abordagem diferenciada”, perspectiva.

Outro foco para 2025 será o lançamento de uma linha própria de produtos cosméticos, fabricados com ingredientes naturais de origem africana. “Queremos criar algo autêntico, sustentável e representativo. Esta linha será o reflexo da nossa visão de empoderamento feminino e valorização das nossas raízes”, revela.

Com um balanço positivo em 2024 e metas claras para 2025, Vanessa Fernandes continua a inspirar, consolidando-se como uma empresária visionária e um agente de mudança, tanto no sector da beleza como na promoção de um futuro mais inclusivo e próspero.

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