O governador do Banco de Portugal, Álvaro Santos Pereira, alertou que, nos próximos anos, os fluxos de financiamento para os PALOP tenderão a ficar restritos à cobertura do serviço da dívida, impondo-se uma consolidação orçamental rigorosa e reformas estruturais profundas para restaurar a sustentabilidade das finanças públicas.
“O elevado nível de endividamento nos países africanos fará com que os fluxos de financiamento fiquem limitados à cobertura do serviço da dívida nos próximos anos”, afirmou o antigo ministro da Economia português, na sessão de abertura dos XXXV Encontros dos Bancos Centrais de Língua Portuguesa.
Segundo o responsável, “os encargos com o serviço da dívida estão em níveis historicamente elevados” e o espaço orçamental dos países africanos “está a reduzir-se mais rapidamente do que noutras economias em desenvolvimento”, num contexto marcado por incerteza global, retração da ajuda internacional e custos de financiamento persistentemente elevados.
Este cenário, acrescentou, “limitará ainda mais o acesso a financiamento externo”, exigindo que os países lusófonos africanos equilibrem as suas contas públicas enquanto avançam com reformas estruturais capazes de restaurar a confiança dos investidores e atrair capital produtivo.
“É absolutamente essencial trabalhar mais na área da dívida, colocando-a numa trajectória descendente e evitando riscos de sobre-endividamento”, sublinhou Álvaro Santos Pereira.
O relatório “Evolução das Economias de Timor-Leste e dos PALOP 2024–2025”, apresentado pelo Banco de Portugal, reforça a mesma preocupação: sem melhorias nas condições de financiamento, vários países enfrentarão dificuldades em refinanciar a dívida existente ou em obter novos recursos em condições sustentáveis, correndo o risco de ver as pressões de liquidez transformarem-se em crises de solvabilidade.
O documento alerta ainda para a combinação de condições financeiras restritivas, pressões cambiais e custos de financiamento elevados, que ameaçam alimentar um círculo vicioso de endividamento, fraco investimento, baixa produtividade e pobreza persistente.
De acordo com o Banco Mundial, o número de países africanos em situação de sobre-endividamento aumentou de oito em 2024 para 23 este ano, correspondendo a metade da África subsaariana.
A Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA) confirma a tendência, referindo que o elevado serviço da dívida tem restringido o espaço fiscal para investimentos em infra-estruturas estratégicas e no desenvolvimento económico.
Embora a dívida pública africana deva descer ligeiramente – de 62,5% para 62,1% do PIB em 2025 – , a ONU alerta que os níveis continuam “comparáveis aos registados antes das iniciativas de alívio da dívida” do início dos anos 2000.
Os custos de serviço da dívida, estimados em 163 mil milhões de dólares em 2024, representam um aumento de 12% face ao ano anterior, permanecendo bem acima dos níveis pré-pandemia e confirmando a pressão financeira estrutural sobre as economias africanas.
*Com Lusa