Na intersecção entre o mundo corporativo e o design de jóias, encontramos Cheila Gomes, CEO e directora criativa da MariaRuby, uma marca de joalharia que vai muito além do luxo material, incorporando histórias, cultura e a força das mulheres africanas. Focada na lapidação e na certificação de garantias, a MariaRuby posiciona-se como um farol de qualidade e responsabilidade social no sector.
Com uma vasta experiência em marketing e gestão, especialmente no sector da indústria extractiva, Cheila decidiu dar um passo ousado ao criar a sua própria marca, inspirada por um percurso único em que pedras preciosas e África se entrelaçam.
Em conversa com a FORBES ÁFRICA LUSÓFONA, Cheila Gomes mostrou ser uma mulher de múltiplas facetas. A luso-moçambicana, nascida em Lisboa, é licenciada em Marketing pelo ISCAP – Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto, com um mestrado em Marketing e Publicidade pela Universidade Lusófona do Porto e outro em Gestão de Negócios em Petróleo e Gás pelo Instituto Superior de Ciências e Tecnologias de Moçambique (ISCTEM).
O seu caminho sempre foi marcado por uma diversidade de coisas. Porém, foi na indústria extractiva, em Moçambique, onde liderou a área de relações públicas da maior mina de rubis do mundo, que Cheila encontrou a sua verdadeira paixão: as pedras preciosas. “Trabalhar no mato, longe da família e dos amigos, num sector dominado por homens em mais de 90%, foi tentador, mas ao mesmo tempo abriu-me portas para um universo fascinante”, revela.
A convivência com minerais como ouro, areias pesadas, mármore, carvão e, principalmente, rubis deu-lhe uma perspectiva única sobre o valor emocional e cultural destes recursos naturais.
Mais do que o simples, Cheila passou a ver a identidade feminina como uma forma de expressão de brilho e poder. “As jóias podem fazer parte da própria personalidade e identidade da mulher, apresentando a sua feminilidade e poder”, afirma.
Com uma carreira já iniciada no marketing e na indústria do petróleo e do gás, muitos poderiam considerar arriscado o salto para a criação de uma marca de joalharia. Contudo, para Cheila, a transição foi natural. “Sempre adorei acessórios, desde malas a lenços, mas foi com as pedras naturais que me apaixonei verdadeiramente”, explica.
A marca MariaRuby nasceu dessa paixão. Inspirada na figura de Maria, uma mulher tipicamente africana, batalhadora, comunicativa, solidária e uma supermãe de família que, somando sucessos ao longo de um caminho persistente, consolidou a sua profissão. “O nome Maria é um dos mais amados do mundo, e o rubi é uma das pedras mais desejadas. Juntar os dois nomes foi a combinação perfeita para mim”, frisa.
A marca, embora internacional, tem África como fonte constante de inspiração. Os núcleos vibrantes, as texturas e os padrões das capulanas (tecidos tradicionais), os embondeiros (árvores icónicas), os animais, as flores, as tradições e os próprios recursos naturais do continente, como as pedras preciosas, estão presentes nas suas criações. Cada peça contém uma história, e é essa singularidade que a distingue.
O processo de criação e sustentabilidade
Uma das principais preocupações de Cheila é garantir que as suas jóias não sejam apenas belas, mas também éticas e sustentáveis. “Uma jóia é sempre incluída por um metal nobre, como ouro, prata, platina, ródio e paládio, normalmente combinados com pedras preciosas. No nosso caso, lutamos pela comercialização de jóias com pedras naturais e de origem sustentável”, nota.
A MariaRuby garante a segurança das suas pedras através de certificados de origem e de Kimberley, bem como certificados gemológicos emitidos por laboratórios reconhecidos. “Temos controlo absoluto sobre a produção das nossas pedras lapidadas, o que nos permite garanti-las aos clientes sem danos, após serem processadas”, explica Cheila. Esta abordagem não só reforça a confiança dos clientes como também atende as preocupações crescentes com a ética e a sustentabilidade na cadeia de suprimentos.
A experiência de Cheila na maior mina de rubis do mundo deixou marcas indeléveis na forma como gere e promove a MariaRuby. “A multinacional onde trabalhei ensinou-me que, mais do que o produto, recomendamos promover todo o valor agregado à volta dele”, reconhece. Na mina, não se tratava apenas de extrair rubis, mas de garantir que a exploração fosse ética e sustentável, beneficiando não só a empresa, mas também as comunidades locais e o país, através do pagamento de impostos e geração de royalties.
“É um grande exemplo para mim. É uma empresa que luta diariamente para cumprir com os seus deveres e obrigações, e arrisco-me a dizer que faz mais do que o normal”, aponta. Foi esta experiência que a motivou a aceitar o desafio de reactivar, após 40 anos, o curso de lapidação de pedras preciosas em Portugal, em parceria com a Universidade de Aveiro.
A influência da experiência internacional na MariaRuby
A vivência de Cheila em diferentes mercados internacionais tem um impacto significativo nas estratégias de marketing e desenvolvimento de produtos da MariaRuby. “As jóias são um tesouro cultural que reflecte os valores, sinceros e a identidade de cada país. As tendências dos consumidores nos diferentes mercados que visitam permitem-me desenvolver estratégias mais eficazes”, revela.
Para o mercado europeu, por exemplo, Cheila opta por designs mais minimalistas e sofisticados, que também se adequam aos mercados africanos, devido às cores vivas das pedras naturais. A diversidade de produtos, a melhoria contínua da qualidade e a atenção aos detalhes, como a embalagem, são aspectos em que aposta fortemente. “A embalagem deve transmitir o produto de forma autêntica”, defende.
A MariaRuby tem enfrentado um percurso desafiante, em termos de investimento, devido à complexidade e ao risco associado ao negócio. O primeiro aporte de capital de 50 mil euros foi direccionado para a aquisição de pedras em bruto e para o processo de lapidação. Além disso, parte dos recursos foi utilizada para lidar com as burocracias relacionadas com a criação da empresa, o registo internacional da marca e a obtenção de licenças para a produção e comercialização de metais preciosos, em conformidade com a exigência da Casa da Moeda portuguesa.
A jovem empreendedora tem vários projectos em andamento que reflectem a visão ambiciosa da MariaRuby. Um deles é a continuidade do curso de lapidação em Portugal, em parceria com a Universidade de Aveiro, para capacitar mais lapidadores e contribuir para o desenvolvimento da joalharia no país.
Outro passa por levar este curso para mercados africanos, capacitando jovens em países ricos em minerais. “A lapidação artesanal é uma profissão em vias de extinção no mundo. Capacitar jovens africanos nesta área poderá abrir portas, não só nos seus países, mas também internacionalmente”, acredita.
Além disso, está em negociações para que a MariaRuby tenha representação em Moçambique e Cabo Verde, expandindo a sua presença em África. “Também estamos a explorar oportunidades na Itália, um mercado forte na área da moda e da joalharia, onde iniciaremos a nossa representação em feiras locais”, adianta.
Quando questionada sobre o que mais a inspira no mundo das pedras naturais, Cheila responde com entusiasmo: “É mágico trabalhar com pedras naturais; é um grande privilégio e um presente da natureza. A diversidade de cores, tamanhos e formatos é inspiradora. Cada pedra é única na cor, o que permite dinamizar o meu trabalho ao ponto de produzir colecções tanto com pedras em bruto como lapidadas.”
O factor surpresa é, para a luso-moçambicana, “fundamental” para manter o interesse e a criatividade durante a produção das colecções. “O mais interessante é que, independentemente de repetirmos algum design, a alegria nunca será igual, pois cada pedra é única”, sublinha.
Visão futurista
Cheila Gomes tem planos ambiciosos para o futuro da sua marca. Num mundo cada vez mais digital, a MariaRuby pretende expandir-se para o comércio electrónico, oferecendo uma experiência personalizada aos clientes. A marca quer envolver os consumidores no processo de criação das suas jóias, desde o design até à escolha das pedras preciosas. “Queremos que cada peça seja única e que o cliente sinta que faz parte dessa criação”, diz.
Nos próximos cinco anos, Cheila vê a MariaRuby como uma marca consolidada, não só em Portugal, mas também no resto da Europa e em África. A ambição é clara: “Queremos celebrar a feminilidade e ajudar as mulheres a expressar o seu poder, autoconfiança e feminilidade através das nossas jóias.”
MariaRuby não é apenas uma marca de jóias, é um símbolo de tradição, cultura e empoderamento feminino, considera Cheila Gomes, que ambiciona deixar uma marca indelével na joalharia mundial, “sempre com uma alma africana a brilhar em cada peça”.