Em Angola e em outros mercados internacionais, como Espanha, Adérito Costa é conhecido como o rei da pitaia, mas é um empreendedor que também aposta na produção de hortaliça, tubérculos, suinicultura, caprinocultura, bovinocultura, piscicultura e cunicultura.
“O título de rei da pitaia foi-me atribuído em 2016, por uma cliente que começou a consumir a minha pitaia desde 2011 por recomendação médica, em função do histórico de anemia falciforme que assolava a sua família. Até 2016, ela, o marido e filhos estavam bem melhores e com poucas frequências clínicas para transfusão sanguínea, por conta do consumo da pitaia da nossa produção”, começa por explicar, em início de conversa com a FORBES ÁFRICA LUSÓFONA.
Segundo conta, a motivação para trazer para Angola a produção de pitaia foi por conta dos seus ricos benefícios para a saúde de quem consome, especialmente se for de produção orgânica. Entretanto, aponta, “os grandes desafios até hoje têm sido de carácter financeiro, porque trabalhar por conta própria não tem sido fácil”. Ainda assim, desde 2007 que o jovem empresário vem resistindo a quedas.
Licenciado em Agronomia pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), Brasil, e em Direito pelo Instituto Superior Politécnico Kalandula de Angola, Adérito Costa, de 38 anos de idade, constituiu em 2022 a Fazenda Mãe Tina Investimentos – Comércio e Prestação de Serviços, localizada no distrito urbano da Cidade Universitária, município de Talatona, em Luanda, com a missão de contribuir para o combate à fome e à pobreza e potencializar os produtores familiares com técnicas inovadoras que agreguem valores na contínua tarefa de produzir alimentos orgânicos.
A Fazenda Mãe Tina Investimentos surgiu para dar continuidade à DGIL – Agricultura & Investimentos, sua primeira empresa no ramo agrícola, aberta para produzir e reduzir os custos, que, inicialmente, obrigou a um investimento acima de 3 milhões de dólares, de forma faseada, visando a construção da estrutura que seria a instalação da empresa, compra de veículos, preparação dos campos, montagem do sistema de irrigação e todo o aparato necessário para que tudo funcionasse.
“Trabalhamos com a empresa DGIL – Dery Gandu Investimentos durante mais de 15 anos. No pós-covid, decidimos trazer a Mãe Tina, porque vimos a necessidade de inovar. É um nome feminino em homenagem a uma pessoa especial, mas que também atrai mais a própria venda”, contou à FORBES ÁFRICA LUSÓFONA, escusando-se, no entanto, a revelar a pessoa homenageada.
A fazenda engloba dois campos de produção com 15 hectares cada um, mas tem um outro no distrito urbano de Calumbo, município de Viana, igualmente com 15 hectares. A rede da Fazenda Mãe Tina produz coentro, alface, couve, jimboa-verde, jimboa-rocha, gindungo, abóbora, pimento, melancia, mamão, pepino, milho, ginguba, bata-doce, feijão-manteiga, berinjela, feijão-preto e feijão. Neste ano, arrancou também com a produção de pitaia.
“Os grandes desafios até hoje têm sido de carácter financeiro, porque trabalhar por conta própria não tem sido fácil.”
Por conta da necessidade constante de atendimento aos clientes, o campo de Talatona começou a receber uma diversidade de culturas, principalmente culturas de curto prazo, sendo que o de Viana produz frutos e algumas hortaliças. “Nesta altura, sem medo de errar, em termos de cálculos, chegamos de fazer um investimento que ronda os 5 milhões de dólares em diversos sectores dentro do agro, porque o agro é uma cadeia que precisa de transporte, câmaras frigoríficas, armazéns e uma série de outros inputs necessários para atender a demanda do mercado”, avançou.
Uma caminhada de altos e baixos
Durante a sua caminhada, nem tudo foi felicidade. O jovem empresário diz ter registado vários incidentes que causaram inúmeros prejuízos financeiros, mas considera que dos acontecimentos negativos ficaram as experiências profissionais que asseguram aquilo que tem estado a fazer hoje, incluindo no processo da produção frutífera que integra a pitaia, cujo maior campo de produção está localizado na província do Bengo.
“Temos estado a envidar esforços para criar outros campos em nome da Fazenda Mãe Tina, saindo um bocadinho da província de Luanda. Nesta altura, surge a necessidade de encontrar potenciais parceiros para atender a agricultura a nível do mercado interno, assim como a nível das exportações dos produtos para outros mercados africanos e europeus”, ressaltou.
Adérito afirma ter chegado à conclusão que nos dias de hoje é impossível crescer financeiramente com fundos próprios, em qualquer que seja o negócio. Daí a necessidade de buscar parcerias e financiamentos que possam ajudar a fazer bem e melhor aquilo que tem sido a sua dinâmica, no sentido de crescer e ganhar de forma contínua, tendo em conta que encara a agricultura como uma arte e um processo contínuo.
Mas, infelizmente, os investimentos do rei da pitaia no sector da agricultura não apresentam apenas resultados positivos, uma vez que teve vários prejuízos, e, muitas vezes, diante de tais situações, já pensou em desistir. Para manter-se firme, diz ter contado “com a força divina”, que, diariamente, “lhe proporcionava oportunidades progressivas”.
Em 2014, por exemplo, registou um prejuízo acima de 18 milhões de kwanzas, devido a um acidente de uma viatura que transportava produtos agrícolas da província de Malanje para Luanda, e um incêndio, “causado por fogo posto” na direcção da empresa, em Talatona, que consumiu boa parte de uma das grandes estruturas, onde eram arquivados os materiais administrativos dos anos anteriores, incluindo facturas de dívidas de algumas instituições e redes comerciais. No global, as perdas atingiram um prejuízo acima de 350 milhões de kwanzas.
Com os documentos perdidos, ficou sem bases para cobrar as dívidas. Como o mal não vem só, a empresa foi também vítima de um roubo interno de 28 milhões de kwanzas.
Entretanto, no que a frutas diz respeito, o rei da pitaia não produz apenas pitaia. Produz uma diversidade de frutos. “Temos estado a trazer resultados palpáveis. Desde 2010 que começámos a vender, e até à presente data mantemos a fórmula de produção, oferecendo frutos doces, suculentos, saudáveis e com benefícios para a saúde de quem os consome”, garantiu o empreendedor.
Quanto a facturação, assume que a empresa não está num bom momento, mas não quis avançar números. Apesar disso, continua firme com a intenção de melhorar a cada dia que passa. “Esta melhoria que não estamos a viver hoje carece de uma injecção de verbas, carece de uma potencialização financeira para que as coisas estejam muito bem estruturadas. Temos estado a incitar contactos junto dos nossos parceiros do sector da banca angolana para ver se conseguimos buscar algum suporte financeiro para restruturar ali aonde estamos a sentir algumas lacunas, a fim de voltarmos a um fluxo de caixa mais elevado do que aquilo que tem sido actualmente”, argumentou.
Para o processo de restruturação, detalhou, numa primeira fase, a Fazenda Mãe Tina, que conta com dois acccionistas e 50 funcionários em diversos campos, maioritariamente provenientes das províncias do Bié, Huíla, Malanje e Uíje, Adérito precisa de 500 milhões de kwanzas, valor base que seria canalizado na montagem da estrutura completa.
No quadro da expansão das suas actividades, a empresa tem ponderado investir na província do Cuanza Norte, concretamente na comuna de Cassualala, no Cuanza Sul (município da Kibala), bem como na província do Huambo, na zona da Chipipa, onde tenciona desenvolver a produção de couve-flor, feijão e milho.
“Nunca fomos de desistir da luta, sempre fomos persistentes, mesmo diante das mais duras adversidades. Porém, todos esses percalços que vivemos serviram-nos de captação de experiências.”
No que diz respeito à produção de pitaia de polpa vermelha, o filho de pai militar e mãe professora garante que estão bem. Nos seus campos, anualmente chegam a produzir acima de 80 toneladas.
No entanto, o empreendedor dá nota que “a capacidade de resposta baixou um pouco”, por conta de vários factores. “Hoje, a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, assim como a guerra entre Palestina e Israel, tem estado a afectar o mercado fornecedor alimentar da Europa, o que pode ser uma vantagem para África. Para o caso de Angola, e especificamente do fruto tropical pitaia, reuni com mais de sete empresários espanhóis e alguns franceses em Março de 2024”, indicou.
Os empresários estrangeiros estão abertos para fornecer alguns bens para o processo de produção, desde que se cumpram os requisitos necessários que o mercado europeu precisa. “Nós já exportávamos pitaia para a Europa, propriamente para Espanha, antes da covid”, recordou.
Com essas guerras, o mercado europeu tornou-se mais exigente e atencioso no processo de exportação de bens alimentares provenientes de África. Para o efeito, o empreendedor está a apostar na criação de condições para atender o processo de exportação.
“Mas não é só da Europa que recebemos solicitação para exportação da pitaia do rei. Também recebemos do mercado da República Democrática do Congo, Ruanda e Gana, que, em Abril [de 2024], nos questionou se tínhamos capacidade para exportar pelo menos 80 toneladas por via terrestre”, notou.
Em função das solicitações do mercado africano e europeu, o rei da pitaia pretende montar um novo campo de produção da fruta de 100 a 200 hectares, mas isso requer parceiros que garantam uma potencialização financeira.
“A visão presente e futura é aumentar a capacidade de resposta produtiva, por conta das várias solicitações que têm surgido, buscar clientes que pretendam ter os seus campos de produção de pitaia, ou parceiros que possam injectar dinheiro para que possamos aumentar a capacidade produtiva em nossos campos”, perspectiva Adérito, em fim de conversa.