O Presidente angolano, João Lourenço, revelou esta Quarta-feira, 15, que, no âmbito da sua política de combate à corrupção e recuperação de activos, a Procuradoria-Geral da República (PGR) conseguiu recuperar a favor do Estado mais de 7 mil milhões de dólares desde o início do processo.
Ao apresentar a mensagem sobre o estado da Nação, o líder angolano acrescentou que os arrestos e apreensões de bens, em Angola e no exterior, totalizam cerca de 12 mil milhões de dólares, envolvendo activos de natureza diversa, desde imóveis e participações empresariais até contas bancárias e investimentos financeiros. A intervenção de Lourenço marcou a abertura do 4.º Ano Parlamentar 2025/2026.
“O combate à criminalidade económico-financeira continua a merecer tratamento prioritário na actuação dos diferentes órgãos”, sublinhou João Lourenço, destacando o papel da PGR “no domínio da repressão”, que tem contribuído para reduzir o sentimento de impunidade no país.
Desde 2017, quando assumiu a Presidência com a promessa de restaurar a integridade do Estado e moralizar a gestão pública, João Lourenço colocou o combate à corrupção no centro da sua agenda política. O programa de recuperação de activos no exterior, iniciado em 2019, foi um dos pilares dessa estratégia, tendo visado património avaliado em mais de 24 mil milhões USD em países como Portugal, Reino Unido, Luxemburgo e Suíça.
Apesar dos progressos internos, o Presidente reconheceu que a lentidão processual e a falta de mecanismos internacionais eficazes continuam a travar resultados mais expressivos. “A informatização dos tribunais e da Procuradoria-Geral da República tem de ser uma realidade se quisermos diminuir o número de pendências processuais”, defendeu, apontando ainda a necessidade de melhorar as condições de trabalho e infra-estruturas do sistema judicial.
Entraves externos e apelo à cooperação
Num tom crítico, João Lourenço voltou a lamentar a falta de colaboração de alguns países, entre os quais a Suíça, que continua a reter activos financeiros angolanos.
“Continuamos a aguardar que, no quadro da sentença do Tribunal angolano e confirmada pelo Tribunal Constitucional, que determina a reversão a favor do Estado angolano de todos os activos financeiros e patrimoniais em Angola e no estrangeiro, as autoridades suíças devolvam as avultadas somas que inexplicavelmente detêm nos seus bancos e que são propriedade de Angola”, afirmou.
O Chefe de Estado destacou também a entrada em funcionamento do Cofre Geral dos Tribunais, instrumento que deverá contribuir para mitigar as dificuldades financeiras que afectam o funcionamento dos órgãos judiciais. A medida integra o esforço de modernização e sustentabilidade institucional do sistema de justiça, considerado crucial para consolidar o Estado de Direito e fortalecer a confiança dos cidadãos.
Com este balanço, João Lourenço reafirma o compromisso político com a transparência e a boa governação, mas reconhece que a credibilidade do sistema judicial e a cooperação internacional serão determinantes para transformar os resultados do combate à corrupção em benefícios tangíveis para a economia e para os angolanos.
Cronologia da Luta Anticorrupção em Angola (2018–2025)
2018 — Nova era de transparência:
Logo após assumir a Presidência, João Lourenço coloca o combate à corrupção como pilar da sua governação, lançando auditorias em empresas públicas e revendo contratos com indícios de irregularidade.
2019 — Estratégia Nacional de Prevenção e Combate à Corrupção:
Aprovado o plano que orienta a actuação da PGR e das entidades fiscalizadoras. Surgem os primeiros grandes processos de recuperação de activos, incluindo bens imobiliários, participações empresariais e contas bancárias.
2020 — Operação Transparência e início dos repatriamentos:
A crise da dívida e a pandemia acentuam a necessidade de liquidez. O Estado anuncia os primeiros valores repatriados voluntariamente e intensifica negociações internacionais para identificar fundos desviados.
2021–2022 — Reforço institucional:
Criação de mecanismos interministeriais de coordenação entre Finanças, Justiça e PGR. Diversos processos chegam a julgamento, incluindo casos mediáticos ligados ao antigo aparelho estatal.
2023 — Consolidação e pressão diplomática:
Angola endurece a sua posição junto de países europeus e do Golfo para repatriamento de activos. As reformas judiciais avançam lentamente, mas aumentam a visibilidade internacional da luta anticorrupção.
2024–2025 — Resultados concretos e novos desafios:
Mais de 7 mil milhões USD recuperados e 12 mil milhões USD arrestados, segundo dados oficiais. Persistem desafios de cooperação internacional e de credibilidade institucional, sobretudo na celeridade processual e gestão dos fundos recuperados.
O desafio de transformar activos recuperados em desenvolvimento real
A política anticorrupção tornou-se uma das marcas mais visíveis da era João Lourenço. Apesar do volume expressivo de activos recuperados, o verdadeiro teste para Angola reside na capacidade de converter esses ganhos jurídicos em impacto económico real — seja no financiamento de infra-estruturas, na melhoria dos serviços públicos ou no reforço da confiança dos investidores.
Num cenário em que a economia procura consolidar a diversificação e estabilizar as contas públicas, a transparência e a responsabilização são hoje activos tão estratégicos quanto o petróleo ou os diamantes.