A jovem de 35 anos de idade, Ondungha Ferreira, está à frente do mais novo empreendimento que veio agregar valor, diversidade e elegância ao sector da restauração do país. Trata-se da Pastelaria Gã-Mela Yummy, um espaço de iguarias que abriu as suas portas no coração da capital guineense, mais propriamente em Bissau-Velho, em meados de Março de 2024.
O espaço surge num momento tanto a quanto sensível, sobretudo da vida política do país, o que, por arrasto, afecta também o ambiente de negócios. Porém, o sentido patriótico da empresária parece ter falado mais alto.
“É o nosso país. Se nós não arriscarmos quem o fará? Depois de ter passado algum tempo fechada em casa, sem muito por fazer, devido a Covid-19, fui experimentado muita receitas e daí decidi abrir um restaurante”, justificou a empreendedora licenciada em Economia pela Faculdade Lusíada de Lisboa, quando questionada pela FORBES ÁFRICA LUSÓFONA sobre as motivações que sustentaram a audácia de investir na Guiné-Bissau, num momento de alguma incerteza sobre o futuro socioeconómico.
Ondungha é esposa de Fernando Cabral, modelo guineense de 38 anos, conhecido nas mais icónicas passerelles de moda internacional. Juntos criaram a empresa Pandora SARL e rumaram à concretização dos sonhos de Ondungha Ferreira, desafiando todas as contrariedades locais. O primeiro negócio foi o restaurante Gã Mela, um nome em crioulo que significa “clã doce”.
O restaurante abriu as suas portas a 12 de Dezembro de 2020, em plena pandemia da Covid-19, numa altura em que grande fatia dos negócios conheciam os seus momentos mais sombrios, com uma alta percentagem a fechar mesmo as portas. Mas, como diz a empresária, “é nos momentos de crise que surgem as grandes oportunidades”.
Ondungha confidenciou que a nível de retorno do investimento, foi exatamente na época de crise que mais facturou. Recorda que nos primeiros meses facturou cerca de 15 mil euros. “Nessa altura, o país parou e como era uma época festiva, muitas pessoas ficaram retidas no país sem ter muito o que fazer. Assim que as pessoas tivessem oportunidade para circular, visitavam o restaurante, sendo que era novidade na altura”, lembra.
O restaurante Gã Mela, disponibiliza diariamente quatro refeições e, como não poderia faltar, também tem as sobremesas. Foi no incrementar das sobremesas e bolos de aniversário para enriquecer o cardápio que surgiu a ideia de abrir um segundo espaço só de doces, uma vez que a procura por esses só tendia a aumentar.

“Não aprecio doces, mas gosto de confecionar algo desigual e entregar qualidade e diversidade aos meus clientes. Iniciamos a fazer sobremesas, de seguida passamos para os bolos de aniversário. Fazíamos na cozinha do restaurante Gã Mela até um dia que os cozinheiros já nos expulsavam, pois, a cozinha já se tinha tornado pequena para a demanda”, conta.
Com a semente da vontade já plantada, todos os sentidos estavam apurados para o novo desafio. Entretanto, surgiu a oportunidade de arrendar o espaço ao lado do restaurante Gã Mela, o que Ondungha não deixou passar. Optou então por arrendar de imediato o espaço, para depois decidir se efetivamente avança ou não com o seu novo projecto.
A empresária partiu para a remodelação do espaço, algo que consumiu cerca de 50 mil euros. As obras duraram cerca ano e meio. Paralelamente foi acumulando experiência no ramo da restauração, tanto no terreno como a nível de formações profissionais de cozinha e pastelaria.
Neste ramo, elege como maiores desafios a parca mão-de-obra qualificada, a falta de produtos no mercado, o pouco engajamento por parte do Estado e as visitas do Ministério do Turismo, “que se resumem à cobrança de taxas, quando também poderiam certificar a qualidade, requerendo mais e melhor”, diz, em jeito de crítica. “Desta forma, os empresários sentiriam alguma observância e exigência, o que iria estimular a elevação”, defende.
Obstáculos desta natureza dificultam a vida dos empresários e muitas vezes convidam os proprietários a desistir. Porém, na conversa com a FORBES, a empresária faz uma vez mais recurso a sua convicção: “Este é o meu país, é aqui que tenho de investir para ajudar a acrescentar valor”. Um lema que leva tanto à risca que acabou por abrir a pastelaria Gã Mela Yummy, a 11 de Março de 2024, uma altura em que a atmosfera sociopolítica estava tensa e claramente indefinida, devido às exigências dos líderes políticos, sociedade civil, jornalistas face ao Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, que pedem a reposição do Estado Democrático.
Uma simbiose de artes da Guiné-Bissau

Gã Mela Yummy é uma pastelaria que surgiu com o propósito de “oferecer qualidade aos citadinos, por via da diversidade na doçaria, aliada ao conforto e elegância do seu espaço cor-de-rosa. A utilização de ingredientes locais para a confeição de pratos, a indúvia dos funcionários com a UNURA, uma marca de roupas nacional, e disposição de quadros de artistas locais, tanto no restaurante como na pastelaria, tornam os dois lugares numa simbiose das várias artes nacionais.
A arquitectura, o mobiliário e o conforto, passando pelos doces na vitrine, tornam a Gã Mela Yummy num espaço convidativo não só para os clientes, mas também para os funcionários, contribuindo para uma maior empregabilidade e formação de quadros guineenses.
A Pandora Sarl emprega, neste momento, 21 funcionários divididos nos dois espaços [restaurante Gã Mela e pastelaria Gã Mela Yummy]. Na sua maioria, os colaboradores são do sexo masculino e a empreendedora explica a opção. “Os homens, para além de estarem no top do mundo na área da culinária, também são mais práticos”, justifica, afirmando que identifica na mulher mais romantismo, “o que faz levarem mais tempo na confecção de tudo”.
Entretanto, Ondungha tem apostado na formação da equipa de trabalho e acredita “já terem conhecimento suficiente”, embora não nega que quando não está por perto, algumas vezes recebe reclamações da baixa de qualidade nos serviços prestados. Ainda assim, isso não lhe leva a desistir a apostar nos colaboradores que possui.
“Não vale a pena mudar de funcionários, pois o problema que me deparo é sempre o mesmo. Prefiro investir nos que já tenho, com um pouco mais de vigor e motivação, do que iniciar um processo vezes sem conta”, entende, afirmando acreditar que “muitos nacionais deixam de investir por falta de coragem ou por se cingirem à opinião dos outros.
Por outro lado, Ondungha Ferreira, diz que os investidores e empresários estrangeiros que manifestam algum interesse pelo país, “precisam conhecer a real Guiné-Bissau para além das redes sociais, pois só estando é que se conhece as potencialidades e os desafios a enfrentar”. Aos nacionais, apela a regressarem, “com bastante coragem e persistência e juntos reconstruirmos o país que é nosso”.