Opinião

Guiné-Bissau: 52 anos de Independência, entre conquistas, desafios e esperança

Francisco de Andrade

No dia 24 de Setembro de 1973, na histórica aldeia de Madina do Boé, a Guiné-Bissau proclamava unilateralmente a sua independência, tornando-se um símbolo de resistência africana e um marco na luta contra o colonialismo português. Poucos meses depois, em 1974, a independência seria reconhecida internacionalmente, abrindo caminho para um percurso de soberania que hoje completa mais de meio século.

Celebrar os 52 anos da Independência não é apenas revisitar um acto político e histórico de libertação, mas também refletir sobre o significado deste meio século para o país, as suas conquistas, os retrocessos e os desafios que continuam a marcar a vida nacional.

A independência trouxe à Guiné-Bissau o direito de autodeterminação e a possibilidade de construir o seu próprio destino. Entre os ganhos alcançados estão a afirmação da identidade nacional, a preservação da memória de luta pela liberdade, a consolidação do país como membro activo da comunidade internacional e a adesão a organismos multilaterais que reforçam a sua voz, como a União Africana, a CEDEAO e a CPLP.

O país construiu, ao longo destas décadas, uma base institucional própria e desenvolveu uma sociedade civil que, apesar das dificuldades, tem sido motor de estabilidade e de promoção da cidadania. O povo guineense, resiliente, mantém viva a cultura, as tradições e o crioulo como expressão de unidade nacional.

Entretanto, o percurso da Guiné-Bissau foi marcado por avanços importantes, mas também por retrocessos significativos. Após a independência, o país enfrentou sucessivas crises políticas, golpes de Estado e instabilidade governativa que afectaram a consolidação democrática e a confiança das populações.

Em termos sociais e económicos, houve progressos no sector da educação, no fortalecimento da agricultura – com destaque para a castanha de caju, principal produto de exportação – e em programas de saúde pública. No entanto, os níveis de pobreza permanecem elevados, a diversificação económica ainda é incipiente e a dependência da ajuda externa continua a ser um traço estrutural.

A instabilidade política frequente comprometeu a atracção de investimento e a execução de políticas de longo prazo, refletindo-se no ritmo do desenvolvimento. Ainda assim, a última década trouxe sinais de maior abertura ao diálogo político e de integração regional, factores que podem ser alicerces para maior estabilidade.

Actualmente, a Guiné-Bissau vive um momento de transição e expectativa. Socialmente, o país continua a enfrentar desafios profundos: mais de dois terços da população vive em condições de vulnerabilidade, e o acesso a serviços básicos como saúde, energia e água potável é limitado.

Economicamente, a dependência do caju representa uma vulnerabilidade, mas também uma oportunidade se o país avançar na transformação local e na diversificação da sua base produtiva. O crescimento sustentável exige igualmente reformas institucionais, combate à corrupção e maior investimento em sectores estratégicos como energia, infra-estruturas e turismo.

Os 52 anos de independência da Guiné-Bissau – que se assinalam neste 24 de Setembro de 2025 – são um momento de orgulho, mas também de consciência crítica.

No plano político, o país aproxima-se de eleições presidenciais num ambiente que promete fortes tensões. O Presidente Umaro Sissoco Embaló oficializou há dois dias a sua candidatura independente à própria sucessão, numa jogada que procura consolidar o seu espaço político para além das estruturas partidárias tradicionais. Em contrapartida, o histórico PAIGC – partido fundador da Nação e símbolo da luta de libertação – viu a sua candidatura rejeitada pelo Supremo Tribunal de Justiça, o que gerou inquietação interna e reacções críticas na cena política e social.

Este cenário aumenta a expectativa em torno do processo eleitoral e levanta questões sobre a inclusão, a legitimidade e a consolidação democrática. O desenrolar desta disputa será determinante para a estabilidade do país e para a credibilidade das suas instituições.

Resumindo, a Guiné-Bissau encontra-se perante uma encruzilhada: ou consolida as bases de uma democracia inclusiva e de uma economia mais diversificada, ou continuará vulnerável à instabilidade e ao atraso estrutural. As perspectivas para o futuro passam por investir no capital humano, na agricultura moderna, na economia azul e em políticas públicas que favoreçam a juventude, que constitui a maioria da população.

O reforço da cooperação regional e internacional, bem como a aposta na diplomacia económica, serão também determinantes para atrair investimento e criar condições para um desenvolvimento sustentável e inclusivo.

Enquadramento geoestratégico e visão na CPLP

A Guiné-Bissau ocupa uma posição geoestratégica relevante na África Ocidental, no Atlântico, e como membro da CEDEAO tem um papel activo nos mecanismos regionais de segurança e integração económica. O país é também parte importante das rotas marítimas e tem potencial de se afirmar na economia azul e na cooperação transatlântica.

No espaço lusófono, a presidência guineense da CPLP representa uma oportunidade para reafirmar o compromisso com a concertação político-diplomática, a mobilidade e a promoção de uma economia mais integrada entre os países de língua portuguesa. A visão da Guiné-Bissau para a CPLP passa por um bloco mais dinâmico, capaz de criar pontes efectivas entre África, América, Europa e Ásia.

Os 52 anos de independência da Guiné-Bissau – que se assinalam neste 24 de Setembro de 2025 – são um momento de orgulho, mas também de consciência crítica. A luta pela independência abriu portas à soberania; agora, a luta é pela prosperidade, pela estabilidade e pelo bem-estar das populações.

Entre memórias de resistência e esperanças de futuro, a Guiné-Bissau reafirma-se como um país de enorme potencial. Mas para transformar esse potencial em riqueza real, que contribua de facto para o desenvolvimento socioeconómico e para o bem-estar da população, é essencial que os cidadãos se dispam de egos e ambições desmedidas e compreendam que só unidos e reconciliados poderão erguer um futuro comum de paz, progresso e dignidade.

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