Guterres exige voz permanente para África e destaca papel de Angola na paz regional

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, reafirmou nesta Segunda-feira, 24, em Luanda, o apoio pleno da ONU à proposta da União Africana que reclama dois assentos permanentes para o continente africano no Conselho de Segurança. Para Guterres, a actual configuração do órgão máximo de decisão internacional permanece “inaceitável”, por continuar a excluir a África…
ebenhack/AP
A primeira intervenção de um secretário-geral da ONU no Parlamento angolano serviu para reforçar um ponto-chave: “a África não pode continuar sem representação permanente no Conselho de Segurança”.
Líderes

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, reafirmou nesta Segunda-feira, 24, em Luanda, o apoio pleno da ONU à proposta da União Africana que reclama dois assentos permanentes para o continente africano no Conselho de Segurança. Para Guterres, a actual configuração do órgão máximo de decisão internacional permanece “inaceitável”, por continuar a excluir a África de uma representação permanente condizente com o seu peso político e demográfico.

As declarações foram feitas durante uma conferência de imprensa na Assembleia Nacional de Angola, após o discurso dirigido ao plenário, num momento que o próprio presidente do Parlamento, Adão de Almeida, classificou como “histórico”, por ser a primeira vez que um secretário-geral da ONU toma a palavra no hemiciclo angolano.

Sem se pronunciar sobre potenciais candidatos africanos aos assentos permanentes – uma decisão que considera caber exclusivamente aos Estados-membros da União Africana – Guterres reconheceu que Angola possui razões sólidas para se orgulhar do seu papel regional. Referiu-se, em particular, à trajectória de reconciliação nacional, à estabilidade interna e à liderança diplomática do Presidente João Lourenço nos esforços de pacificação dos Grandes Lagos e na actuação da União Africana.

Questionado sobre o desempenho angolano na presidência da UA, o líder da ONU destacou a “identidade de pontos de vista” entre as duas organizações em domínios essenciais como paz, desenvolvimento, democracia e direitos humanos. Sublinhou, igualmente, a firmeza da organização continental na gestão de crises que afectam países como a RDC, o Sudão, o Sudão do Sul e as nações do Sahel, desafios que, no seu entender, reforçam a urgência de uma reforma estrutural no sistema multilateral.

O secretário-geral manifestou ainda confiança de que, apesar das resistências geopolíticas, as reformas necessárias ao sistema internacional acabarão por prevalecer, abrindo caminho a uma representação mais justa para a África e para o conjunto dos países em desenvolvimento.

Parlamento angolano como espelho da evolução democrática

Na intervenção dirigida aos deputados, António Guterres destacou o papel central da Assembleia Nacional na consolidação da democracia angolana, sublinhando que o Parlamento reflecte a transição do país da era do conflito para a construção de um pluralismo político amadurecido. Elogiou o esforço legislativo dos últimos anos, incluindo as reformas no quadro eleitoral, que classificou como expressão de maturidade institucional.

O português reconheceu o contributo do Parlamento na aproximação entre o Estado e os cidadãos, na protecção do espaço cívico e na promoção da inclusão política, factores que, segundo afirmou, reforçam a confiança internacional em Angola e evidenciam a importância de instituições robustas para um futuro democrático e sustentável.

A leitura de Adão de Almeida: multilateralismo, democracia e desafios globais

Na recepção ao secretário-geral, o presidente da Assembleia Nacional destacou o simbolismo do momento, coincidente com as celebrações dos 50 anos da Independência de Angola. Recordou que, após 23 anos de paz, o país vive um ciclo de estabilidade que permitiu aos angolanos “caminhar de mãos dadas numa terra reconciliada” e assumir o desafio de construir uma nação desenvolvida e inclusiva.

Adão de Almeida salientou, contudo, os desafios actuais para consolidar a democracia, fortalecer as instituições e assegurar o pleno exercício dos direitos fundamentais. Considerou o Parlamento um espaço onde “a diferença se transforma em instrumento de concretização democrática”, reafirmando o seu papel na arquitectura do Estado.

O líder parlamentar evocou ainda as tensões que marcam o panorama global, sublinhando que a paz mundial permanece um objectivo por alcançar. Defendeu o multilateralismo como via essencial para a preservação de relações internacionais justas, valorizou a transição energética como oportunidade para países menos desenvolvidos e reiterou a necessidade de reformar o sistema de governação global, com particular enfoque no Conselho de Segurança.

No encerramento, encorajou António Guterres a prosseguir na defesa de um mundo mais justo, mais equilibrado e mais solidário, alinhado com os princípios fundadores da ONU.

Mais Artigos