O ministro da Indústria e Comércio de Angola, Rui Miguêns, defendeu esta Terça-feira, 26, no Polo Industrial de Viana, que o caminho para estabilizar os preços no mercado nacional passa pelo aumento da produção e da produtividade.
Falando no encontro “Missão, Desafios e Oportunidades das Indústrias de Bens Alimentares em Angola”, o governante sublinhou que apenas uma indústria mais competitiva poderá alinhar o custo dos alimentos com o poder de compra da população. “Temos que produzir mais, com maior qualidade e preços adequados ao nível de rendimento das famílias”, afirmou.
O sector enfrenta desafios proporcionais ao crescimento demográfico, de cerca de 3,3% ao ano, e uma factura de importações superior a 30 mil milhões de dólares. Contudo, Rui Miguêns destacou que a produção nacional tem registado um crescimento sustentável, permitindo já a autossuficiência em alguns segmentos.
Com 143 unidades industriais alimentares de média e grande dimensão, o sector tornou-se crucial para gerar emprego, reduzir importações e consolidar a soberania alimentar.
O ministro de Estado para a Coordenação Económica, José de Lima Massano, também presente no encontro, reconheceu que, apesar do crescimento de dois dígitos, a indústria continua dependente de factores externos. Defendeu, por isso, maior integração das cadeias produtivas e diálogo estruturado entre Executivo e operadores.
Nesse sentido, foi sugerida a criação de uma associação específica para o sector de bens alimentares, proposta que mereceu apoio do sector privado.
Wanderley Ribeiro, presidente da Associação Agropecuária de Angola (AAPA), afirmou que estruturas organizadas são essenciais para uma comunicação eficaz com o Governo. Já César Rasgado, presidente da Associação de Produtores de Farinha de Trigo (AFPTA), lembrou que Angola já atingiu a autossuficiência na produção de farinha, mas precisa melhorar eficiência logística e competitividade.
O encontro reafirmou o compromisso do Executivo em promover maior colaboração público-privada, atrair investimentos e acelerar a modernização da indústria nacional.

O paradoxo da indústria alimentar em Angola
O debate sobre preços e produtividade revela um paradoxo da indústria alimentar angolana. Ao mesmo tempo em que conquista autossuficiência em produtos como farinha de trigo, continua vulnerável à volatilidade dos custos externos, como o transporte, energia e fertilizantes.
A institutionalização do sector poderá facilitar a negociação de insumos, defender interesses comuns e impulsionar economia de escala, mas o verdadeiro teste será reduzir a dependência externa e assegurar estabilidade de preços num ambiente de inflação persistente.
Na região da África Austral, Angola ainda está atrás de benchmarks importantes em termos de autossuficiência alimentar. Por exemplo, a Namíbia alcançou 45% de autossuficiência pela primeira vez em 15 anos, graças ao fortalecimento da produção local e ao apoio do Programa Alimentar Mundial. Angola, por sua vez, ainda importa produtos essenciais como arroz, óleo de palma, farinha de trigo e carne de frango, totalizando cerca de 2 mil milhões de dólares em importações alimentares em 2023, o que corresponde a 13% de todas as importações do país.
Ainda que Angola produza volumes significativos de raízes, tubérculos, frutas e cereais (como milho), isso ainda está longe do suficiente para atender a sua população, que ultrapassa os 30 milhões de habitantes.
Em contrapartida, o Governo estipulou metas ambiciosas, como alcançar autossuficiência de milho até 2030, elevando a produção de 4,5 milhões para cerca de 10 milhões de toneladas por ano e expandindo a área cultivada dos actuais 5 para 7 milhões de hectares.
Essa trajectória não é apenas um plano agrícola. É uma estratégia de resiliência económica e geopolítica. Ao reduzir vulnerabilidades frente à importação e à inflação global, Angola busca tornar-se menos dependente de divisas, fortalecer o seu mercado interno e projectar-se como um hub agroindustrial na África Austral. Essa ambição visa atrair investimentos e consolidar a sua posição regional, alinhada com a agenda de segurança alimentar promovida pela União Africana.