Opinião

Liderar na era da exaustão silenciosa

Carlos PIN Vaz

Durante anos falámos de liderança, motivação, gestão de equipas. Hoje, em Angola, o centro da conversa mudou: já não basta “tirar resultados”, é preciso garantir sustentabilidade humana.

A forma como lideramos está a decidir, todos os dias, quem permanece inteiro… e quem quebra em silêncio.

Burnout deixou de ser fragilidade individual para se tornar KPI de liderança. Quando prazos irrealistas, reuniões infindáveis e e-mails a qualquer hora se tornam norma, o esgotamento é apenas uma consequência lógica. E quando o próprio líder está em exaustão, lidera em modo sobrevivência, não em modo visão.

A inteligência emocional ganhou uma tradução prática: segurança psicológica. As pessoas sentem-se livres para falar, discordar, errar e pedir ajuda sem medo de represálias? Numa cultura de culpa a inovação morre; numa cultura de escuta, as soluções aparecem, mesmo em contextos económicos duros como o nosso.

Outra mudança decisiva é a liderança de equipas híbridas e à distância. Em Luanda, Benguela ou Soyo, muitos colaboradores já trabalham entre casa, rua e escritório. Liderar assim exige rituais de proximidade: reuniões curtas e claras, conversas um-a-um, critérios transparentes de avaliação, inclusão de quem está “do outro lado do ecrã”.

Equidade, dignidade e respeito deixaram de ser temas “suaves”. São hoje elementos do contrato psicológico: jovens talentos angolanos não aceitam permanecer em ambientes tóxicos. Querem propósito, desenvolvimento e líderes coerentes entre o que dizem e o que fazem.

A chegada da IA trouxe mais um paradoxo: medimos quase tudo, menos o que se passa no coração das pessoas. Algoritmos podem classificar como “desengajados” colaboradores que, na verdade, estão só exaustos. Quanto mais tecnologia usamos, mais humanidade consciente é exigida da liderança.

O novo toolkit do líder angolano deve incluir: capacidade de coaching, literacia emocional, competência digital, sensibilidade à diversidade e pensamento sistémico. Sobretudo, coragem ética para dizer “não” a práticas que adoecem as equipas, mesmo sob pressão de curto prazo.

Fica o convite: quantas pessoas nas nossas equipas estarão a sofrer em silêncio? Que mensagem enviamos quando respondemos a mensagens à meia-noite? Que decisões precisamos de tomar, hoje, para que a nossa organização seja um lugar onde é possível trabalhar… e continuar saudável, humano e inteiro?

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