Face às recentes alterações no panorama macroeconómico, o Conselho de Ministros decidiu rever em baixa a previsão de crescimento económico para o presente ano. Assim, a economia moçambicana deverá avançar apenas 1,6%, abaixo dos 2,9% estimados em Junho.
“Com efeito, em 2025, a economia registou uma queda de 3,9% no primeiro trimestre e uma contracção média de 2,4% no semestre, levando a uma revisão em baixa do crescimento económico em 1,3 pontos percentuais para 2025”, refere o Executivo.
Mesmo com a aguardada retoma, em 2026, do projecto de gás natural liderado pela TotalEnergies, suspenso devido à insegurança em Cabo Delgado, o Governo reconhece que a dinâmica económica será inferior ao previsto no Plano Económico e Social e Orçamento do Estado.
“Com efeitos desfasados em 2026, estimando-se uma redução adicional de 0,4 pontos percentuais face às projecções iniciais”, indica o comunicado de imprensa consultado pela FORBES ÁFRICA LUSÓFONA. Na prática, o crescimento de 2026 deverá situar-se em 2,8%, e não 3,2%.
A actualização dos pressupostos macroeconómicos revela igualmente um impacto directo sobre as contas públicas. O Executivo estima que a arrecadação de receitas em 2025 totalize 361,8 mil milhões de Meticais, cerca de 24 mil milhões abaixo da previsão inicial. Para 2026, a revisão é também negativa, com uma redução estimada em 14,9 mil milhões de Meticais.
Para conter o défice orçamental, o Governo pretende ajustar variáveis-chave, sobretudo através da revisão de projectos de investimento não prioritários, assegurando, porém, o financiamento dos serviços essenciais e das políticas sociais fundamentais.
O documento aprovado nesta Terça-feira, 25, – a Proposta de Lei que altera o Plano Económico e Social e Orçamento do Estado (PESOE) 2026 – segue agora para apreciação na Assembleia da República.
Analistas avaliam o recuo nas projecções e defendem ajustes estratégicos para impulsionar o crescimento
Para Júlio Saramala, economista, a revisão em baixa do crescimento revela “maturidade” do Executivo em admitir que as projecções para 2026 eram demasiado optimistas. Ainda assim, defende que havia espaço para cortes mais profundos.
“Penso que poderiam baixar ainda mais. Isso mostra que não se trata apenas de um ajuste técnico, mas de fragilidades estruturais que já se arrastam há alguns anos e que agora se tornam mais visíveis”, afirma.
Segundo Saramala, a revisão indica que pressupostos como produção, consumo, investimento, exportações ou estabilidade não estão a concretizar-se. E identifica três factores determinantes: a desaceleração da actividade económica, o comportamento volátil da indústria extractiva e a persistente incerteza macroeconómica.
“No primeiro ponto, pesa a tensão pós-eleitoral e a elevada dependência do sector informal, de baixa produtividade, enquanto a massa salarial continua elevada e limita o espaço para investimento público. No segundo, a dependência dos megaprojectos torna a economia vulnerável – a auditoria aos custos recuperáveis da TotalEnergies, as incertezas na Mozal e outros sinais mostram isso. No terceiro, a incerteza mantém-se: a inflação, embora controlada, é um risco; as taxas de juro rondam os 20%; e há mais financiamento para o Estado do que para os sectores produtivos”, detalha.
Para inverter o quadro, Saramala sugere maior controlo da massa salarial, alocação eficiente de recursos para sectores de maior retorno, eliminação de redundâncias institucionais, diversificação tributária e alargamento da base fiscal. E reforça a urgência de diversificar a economia.
“Se os dividendos dos megaprojectos forem canalizados para agricultura, turismo e outros sectores com maior capacidade multiplicadora, o impacto será mais forte. Falta-nos uma cadeia de valor completa e indústrias transformadoras. E não podemos esquecer o capital humano e a lei de conteúdo local”, afirma.
Por sua vez, Piedade Nogueira, outra economista ouvida pela FORBES, alerta que uma economia ainda em fase de maturação como a de Moçambique depende fortemente de capital externo, condição que a expõe aos humores dos investidores.
“Todo o financiamento externo é condicionado à estabilidade económica e política. Saímos da lista cinzenta, mas persistem incertezas, sobretudo após os episódios da tensão pós-eleitoral, que afectaram o tecido económico e social, quebraram a confiança e levaram muitas empresas a encerrar, agravando o desemprego”, nota.
Para Piedade, o país precisa de redobrar esforços para recuperar investidores externos e domésticos, criando um ambiente mais transparente e previsível. “O Executivo deve melhorar o modelo de governação, combater a corrupção e reduzir a burocracia na gestão pública, factores que têm travado o crescimento económico. Fundos que deveriam reforçar o erário acabam desviados, reduzindo as receitas do Estado”, afirma.
Diante deste cenário, a economista considera crucial uma revisão profunda das despesas públicas. “Grande parte do orçamento destina-se a salários e subsídios. É necessário reavaliar gastos, melhorar o défice e reforçar a credibilidade. O Estado deve priorizar investimentos que gerem retorno económico e social, assegurando serviços essenciais como educação, saúde e segurança, com qualidade. Só assim se criará estabilidade para dinamizar sectores com maior potencial de arrecadação tributária”, defende.
Piedade Nogueira sublinha ainda a importância de o Estado pagar atempadamente os serviços prestados pelo sector privado, para evitar que empresas fiquem sem liquidez para reinvestir. E lembra que fenómenos climáticos recorrentes têm afectado a produção interna, contribuindo para a revisão em baixa das projecções económicas.





