Opinião

O diamante como uma força competitiva para Angola: análise do seu impacto global e económico

Ana Cristina Sousa Costa

A exploração e venda de diamantes inserem-se em um contexto global altamente regulado e competitivo, com uma série de normas internacionais que visam garantir a qualidade, a ética e a sustentabilidade do mercado. Os diamantes, desde a sua extração até o comércio final, são regulados por acordos multilaterais, organizações internacionais e práticas industriais específicas, que buscam equilibrar os interesses económicos com a protecção dos direitos humanos, o respeito ao meio ambiente e a transparência nos processos de negociação. O mercado de diamantes é, portanto, uma rede interligada que envolve países produtores, intermediários, joalheiros e consumidores finais, cujas dinâmicas são profundamente impactadas por variáveis económicas, políticas e sociais globais.

O Processo de Kimberley (Kimberley Process Certification Scheme – KPCS), implementado em 2003, é uma das principais iniciativas internacionais para regulamentar o comércio de diamantes e evitar o tráfico de “diamantes de conflito” ou “diamantes de sangue”. Este acordo foi criado para garantir que os diamantes extraídos em áreas de conflito não financiem grupos armados e abusos dos direitos humanos. Actualmente, o KPCS conta com mais de 80 países signatários e exige que todos os diamantes importados ou exportados possuam um certificado que comprove sua origem legítima. O processo tem sido uma ferramenta importante para aumentar a transparência na cadeia de fornecimento de diamantes e assegurar que o comércio não seja utilizado como um meio de perpetuar conflitos.

Além do KPCS, o mercado de diamantes também é regulado por práticas e certificações de qualidade, como o Sistema de Qualidade 4C (corte, cor, clareza e quilate), desenvolvido pelo Gemological Institute of America (GIA). Este sistema de classificação é amplamente utilizado por produtores, revendedores e consumidores para garantir que os diamantes sejam avaliados com precisão, de acordo com critérios universais. Assim, os compradores têm confiança de que estão adquirindo diamantes com qualidade garantida, enquanto os vendedores podem comercializar os produtos a preços que reflitam seu valor real no mercado global.

O comércio de diamantes também é fortemente influenciado por grandes empresas multinacionais, como a De Beers, que historicamente controlaram grande parte da produção e distribuição global. Embora sua influência tenha diminuído com o tempo devido ao aumento de novos produtores, especialmente na África e na Rússia, essas grandes empresas ainda exercem um papel importante na estabilização dos preços e na manutenção da estrutura de mercado. A De Beers, por exemplo, possui um controle significativo sobre a produção de diamantes e, por meio de sua política de oferta controlada, tenta evitar a superabundância no mercado, o que poderia depreciar o valor do diamante.

A globalização também tem impactado o setor de diamantes, com novas rotas comerciais sendo abertas para países anteriormente pouco envolvidos na extração ou venda desse recurso. Países como Rússia, Botswana, Canadá, África do Sul e Angola desempenham um papel crucial na produção de diamantes, sendo responsáveis por grande parte da oferta mundial. Além disso, os avanços tecnológicos, como a mineração de diamantes sintéticos, têm modificado as dinâmicas do mercado, oferecendo uma alternativa mais acessível e menos controversa em termos de impactos ambientais e sociais. Essa inovação tem levado a uma reavaliação da definição do que constitui um “diamante genuíno” e como ele é valorizado pelos consumidores.

O comércio de diamantes enfrenta desafios em relação à transparência e à rastreabilidade dos produtos ao longo da cadeia de fornecimento. Iniciativas como a Iniciativa para Diamantes Responsáveis (Responsible Jewellery Council – RJC) têm ganhado destaque, incentivando as empresas a adotarem padrões éticos e ambientais rigorosos. Além disso, novas tecnologias, como a blockchain, estão sendo exploradas para garantir a rastreabilidade dos diamantes, permitindo que os consumidores saibam a origem exata de cada pedra. Com a crescente pressão por maior responsabilidade corporativa e o aumento da conscientização pública sobre os impactos da exploração de diamantes, espera-se que o setor continue a evoluir em direção a práticas mais éticas e transparentes, alinhadas com as exigências globais de sustentabilidade e direitos humanos.

Relativamente à variação do preço do diamante a nível mundial nos últimos três anos, esta tem sido influenciada por uma combinação de fatores econômicos, geopolíticos e tendências no mercado global. De 2021 a 2024, o preço do diamante experimentou flutuações devido a mudanças na oferta e demanda, assim como a fatores externos como a pandemia de COVID-19, a inflação, os avanços tecnológicos e a crescente demanda por diamantes sintéticos.

Impacto da Pandemia de COVID-19 (2021-2022)

No início da pandemia, em 2020, a indústria de diamantes foi profundamente afetada pela interrupção das cadeias de suprimento, encerramento de lojas e suspensão da produção em minas ao redor do mundo. No entanto, em 2021, o mercado global de diamantes experimentou uma recuperação inesperada. A demanda por joias, especialmente diamantes, aumentou durante o período pós-pandemia, à medida que a economia global começava a se estabilizar e o consumo de luxo se intensificou. O aumento das compras de diamantes também foi impulsionado pela retomada das cerimônias de casamento e pelo crescimento das vendas online. Isso resultou em uma escassez temporária de oferta, elevando os preços das pedras preciosas em alguns segmentos do mercado.

Desafios na Oferta e Escassez de Mineração (2022-2023)

Nos anos seguintes, a oferta de diamantes começou a ser impactada por questões de produção. Algumas das principais minas de diamantes, localizadas na Rússia e em partes da África, enfrentaram dificuldades operacionais, enquanto grandes produtores, como a De Beers, reduziram suas vendas devido à incerteza econômica global. A guerra na Ucrânia, que começou em 2022, teve um impacto adicional no setor, pois a Rússia é um dos maiores produtores de diamantes do mundo, gerando preocupações sobre a disponibilidade do diamante russo no mercado internacional. A combinação da redução da oferta com a recuperação da demanda fez com que os preços subissem, especialmente para diamantes de alta qualidade.

Inflação e aumento dos custos de produção (2023-2024)

Em 2023 e 2024, o aumento da inflação global, especialmente nos Estados Unidos e na Europa, afetou os preços de produção de diamantes. Os custos de energia, mão de obra e transporte aumentaram, impactando diretamente os custos operacionais das minas. Isso resultou em um aumento nos preços dos diamantes, já que as empresas de mineração repassaram os custos adicionais aos consumidores. Ao mesmo tempo, a incerteza econômica e a desaceleração do crescimento nas economias globais afetaram a confiança do consumidor, fazendo com que a demanda por diamantes mais acessíveis e menos preciosos (como os sintéticos) crescesse, ajudando a moderar os preços dos diamantes de menor qualidade.

Diamantes sintéticos e sustentabilidade (2023-2024)

Nos últimos três anos, o crescimento do mercado de diamantes sintéticos também impactou os preços dos diamantes naturais. Os diamantes lab-grown, produzidos em laboratórios utilizando tecnologias como a deposição de vapor de carbono (CVD) e a alta pressão e alta temperatura (HPHT), tornaram-se mais populares devido ao seu menor custo e à crescente preferência dos consumidores por produtos “éticos” e sustentáveis. Como resultado, houve pressão para que os preços dos diamantes naturais se mantivessem competitivos, especialmente para as pedras de menor quilate. Isso levou a uma diferenciação crescente no mercado, onde diamantes de maior qualidade e com certificações específicas, como os de origem responsável, hy continuaram a ver aumento de preços, enquanto os de menor qualidade tiveram seus preços estabilizados ou em queda.

Para 2025, ainda há um grau elevado de incerteza em relação aos preços de venda, pois, sendo uma commodity, o controle de sua variação não depende apenas da empresa exploradora, mas sim da ação coletiva do mercado internacional. A perspectiva para o preço de venda dos diamantes em 2025 apresenta um grau considerável de incerteza, embora verifique-se uma tendência de valorização para diamantes de alta qualidade e raros, aliada ao aumento contínuo da demanda por produtos de luxo. Contudo, a concorrência dos diamantes sintéticos, que continuam a ganhar popularidade por seu menor custo e maior sustentabilidade, pode moderar a alta nos preços dos diamantes naturais de menor qualidade. A estabilidade do mercado dependerá também da oferta, com a produção das grandes minas e os desafios geopolíticos, como a guerra na Ucrânia e as políticas de comércio da Rússia, influenciando a dinâmica global do setor.

Contexto nacional

A exploração e venda de diamantes em Angola é uma das principais atividades econômicas do país, com a indústria de diamantes representando uma parte significativa do PIB e das exportações. A exploração de diamantes em Angola é dominada por grandes concessões, especialmente nas províncias de Lunda Norte e Lunda Sul, onde estão localizadas as principais minas do país. Angola possui algumas das maiores reservas de diamantes do mundo, tanto em volume quanto em qualidade, destacando-se pelos diamantes de alta qualidade, com cor e clareza excepcionais. O setor de mineração é essencial para a economia angolana, gerando empregos e receita, além de atrair investimentos estrangeiros, especialmente de empresas internacionais e parcerias público-privadas.

Nos últimos anos, o governo angolano tem trabalhado para reformar o setor de mineração, buscando aumentar a transparência e combater a corrupção e a informalidade, que historicamente marcaram a indústria de diamantes. A criação do Angola Mining Code e a implementação de novas políticas de licenciamento e fiscalização têm procurado garantir uma maior conformidade com normas internacionais, como o Processo de Kimberley, que visa evitar o comércio de “diamantes de sangue”. Além disso, o governo tem incentivado a diversificação econômica, buscando agregar valor à produção local por meio do desenvolvimento de indústrias de lapidação e da promoção de um mercado interno mais robusto para o consumo de diamantes. A ideia é não apenas extrair, mas também agregar valor aos diamantes, criando empregos e fortalecendo a indústria de joias.

Entretanto, a exploração de diamantes em Angola enfrenta desafios significativos, incluindo a necessidade de modernização das infraestruturas e a dependência de práticas de mineração artesanal, que, apesar de representarem uma parte importante da produção nacional, muitas vezes operam à margem da legalidade e não atendem aos requisitos ambientais e de segurança. O país também lida com questões de sustentabilidade, como os impactos ambientais da mineração intensiva e a pressão internacional por práticas mais responsáveis. O controle da cadeia de suprimentos e a rastreabilidade dos diamantes extraídos continuam sendo áreas críticas para garantir que o país se mantenha em conformidade com os padrões globais e não sofra sanções ou restrições no comércio internacional. Apesar disso, Angola tem se esforçado para modernizar sua indústria de diamantes, e as perspectivas são positivas, especialmente com o recente aumento de investimentos no setor e a busca por mais parcerias internacionais. Infelizmente, ainda depende única e exclusivamente de vendas feitas ao exterior, dependendo do preço em mercado regulamentado.

Performance do sector em 2024

A performance do setor de exploração mineira em Angola em 2024 mostra sinais de recuperação e transformação, com um foco crescente na diversificação econômica e no aprimoramento da sustentabilidade. Embora o país continue a ser um dos principais produtores de diamantes, com minas localizadas principalmente nas províncias de Lunda Norte e Lunda Sul, o setor enfrenta tanto desafios quanto oportunidades. Em 2024, o governo angolano implementou reformas importantes visando modernizar a indústria, com ênfase na formalização da mineração artesanal, na transparência e na adequação às normas ambientais internacionais. O setor também está sendo impulsionado pelo crescente interesse por investimentos estrangeiros e parcerias público-privadas. Grandes empresas internacionais têm demonstrado confiança nas perspectivas de longo prazo do mercado angolano, especialmente com a promessa de novas infraestruturas de transporte e melhorias no licenciamento e fiscalização da mineração.

Entretanto, a performance do setor de mineração em Angola também enfrenta desafios significativos em 2024. A mineração artesanal, que ainda representa uma parcela importante da produção de diamantes, continua a ser uma fonte de preocupação, principalmente em relação à segurança e ao impacto ambiental. A necessidade de melhorar a gestão ambiental das atividades de mineração é urgente, especialmente em regiões ecologicamente sensíveis. Além disso, a variação dos preços globais das commodities, incluindo o diamante, influencia diretamente os resultados do setor, com a volatilidade dos mercados internacionais representando um risco para a sustentabilidade da exploração mineira. Apesar disso, a performance do setor em 2024 tem sido positiva, com um crescimento moderado e perspectivas favoráveis para os próximos anos, caso as reformas em curso sejam efetivas e a estabilidade global se mantenha.

Perspectivas futuras

É uma grande oportunidade para nos posicionarmos na linha de frente, baseados nas práticas de boa governança e transparência a nível nacional e internacional. Criar o selo do Diamante Angolano é uma chancela importante para um produto relevante no mundo, garantindo a rastreabilidade da produção, comercialização a bruto e a lapidação como fonte de uma nova indústria a ser desenvolvida. Não existe uma “bolsa de valores” exclusivamente para diamantes, da mesma forma que para ações ou commodities como petróleo; o comércio de diamantes é regulado por plataformas especializadas, como o Diamond Exchange de Antuérpia, na Bélgica, e outras praças importantes de negociação ao redor do mundo. Temos de nos atualizar face a essas modernidades globais e implementá-las para garantir o crescimento do setor em conformidade com os grandes players mundiais. Para estar na primeira liga, diz-se que precisamos nos preparar antecipadamente para esses desafios. Assim, devemos criar todas à disposição!

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