A globalização, ao longo das últimas décadas, transformou profundamente as economias e sociedades ao redor do mundo. Entretanto, esse fenómeno tem-se reconfigurado, impulsionado por factores como avanços tecnológicos, crises financeiras, pandemias e mudanças geopolíticas. Para 2025, os economistas de renome e as principais agências de risco e financeiras, como o FMI e o Banco Mundial, oferecem perspetivas cautelosas, destacando desafios e oportunidades para as principais economias globais. O conceito de Desglobalização 2.0, conforme discutido por alguns autores e economistas, também oferece uma perspectiva importante sobre o momento actual.
Um dos factores mais determinantes para a economia mundial nos últimos anos tem sido o impacto do conflito entre Rússia e Ucrânia, que gerou choques significativos no mercado de energia e volatilidade nos mercados financeiros, além de reconfigurar as cadeias globais de suprimento.
Contextualização histórica
Nas décadas de 1980 e 1990, a globalização foi impulsionada pelas reformas neoliberais e pela abertura das economias ao comércio internacional. O economista Paul Krugman, nobel e professor de economia e assuntos internacionais, sublinhou o impacto positivo do comércio global nas economias emergentes e o crescimento acelerado em mercados como China e Índia.
No entanto, à medida que o comércio global se expande, os desequilíbrios económicos, as crises financeiras e a desigualdade crescente, aumentam alguns temas centrais de debates. Joseph Stiglitz, conhecido pela sua visão crítica da gestão da globalização, crítica a globalização, destacou que muitas economias emergentes e em desenvolvimento não estavam a colher os frutos de forma igualitária, o que se agravaria com as crises subsequentes.
A pandemia de COVID-19 gerou disrupções globais sem precedentes, evidenciando a fragilidade das cadeias de suprimentos e acelerando uma mudança de paradigma no comércio internacional. Como destaca Gustavo Miotti especialista em ciências económicas e globalização, esta nova fase, chamada por ele de Desglobalização 2.0, representa um retrocesso na integração económica mundial, em parte causada pelas crises recentes, como a pandemia e a guerra na Ucrânia.
De acordo com o Banco Mundial, o crescimento global foi fraco em 2024, projectando-se fechar em torno de 2,6%, o que representa quase meio ponto percentual abaixo da média de 2010-2019. As contínuas pressões inflacionárias levarão os bancos centrais a manter uma postura cautelosa, com taxas de juros de referência significativamente mais altas do que antes da pandemia. A dívida alta e os custos elevados de serviço da dívida exigem dos formuladores de políticas públicas nos mercados emergentes e economias em desenvolvimento (MEEDs) um equilíbrio cuidadoso entre investimentos e sustentabilidade fiscal.
Para impulsionar o crescimento a longo prazo, o Banco Mundial sublinha a importância de desenvolver políticas que favoreçam o crescimento da produtividade, melhorem a eficiência do investimento público, construam capital humano e reduzam as lacunas de género no mercado de trabalho. A guerra Rússia-Ucrânia também aumentou a incerteza geopolítica, pressionando ainda mais as economias emergentes e elevando a volatilidade nos mercados financeiros.
De acordo com as previsões mais recentes do Banco Mundial, o crescimento global deverá permanecer relativamente estável, com uma taxa projectada de 2,6% para 2024 e 2,7% para 2025, conforme mostrado na Tabela 1.1 a seguir:
Estes dados reflectem uma desaceleração moderada do crescimento em 2023 e uma leve recuperação até 2025, com as economias emergentes e em desenvolvimento a manter um crescimento mais forte que as economias avançadas. No entanto, é importante destacar os seguintes pontos:
- Crescimento global: O crescimento global para 2024 e 2025 é projectado em 2,6% e 2,7%, reflectindo as dificuldades de recuperação plena das economias pós-pandemia, agravadas por factores como a inflação e as tensões geopolíticas.
- Economias avançadas: O crescimento em economias avançadas, como Estados Unidos e Europa, permanece estável em torno de 1,5% a 1,7%, devido à política monetária mais restritiva e ao aumento dos custos de energia.
- Economias em desenvolvimento: Economias emergentes e em desenvolvimento devem continuar crescendo a taxas mais rápidas, projectando-se 3,6% a 3,7% em 2024 e 2025, respectivamente, impulsionadas principalmente pelo dinamismo de regiões como o Sul da Ásia e a África Subsaariana.
- Leste Asiático e Pacífico: O crescimento nesta região é projectado em 4,8% em 2024, mas cai para 4,2% em 2025, reflectindo a desaceleração das principais economias, incluindo a China.
- América Latina e Caribe: Esta região enfrentará um crescimento mais modesto, com uma leve recuperação de 1,8% em 2024 para 2,7% em 2025, com o impacto de tensões internas e o aumento da inflação.
- Oriente Médio e Norte da África: Devido ao impacto dos altos preços do petróleo, espera-se que o crescimento suba de 2,8% em 2024 para 4,2% em 2025.
Estes dados nos fornecem um panorama claro das tendências de crescimento até 2025, destacando tanto a recuperação global moderada quanto as diferenças regionais. Com base nos impactos de crises energéticas, como o conflito Rússia-Ucrânia, as previsões reflectem a expectativa de um crescimento mais modesto, especialmente em economias avançadas, enquanto regiões emergentes, como o Oriente Médio e a Ásia, poderão beneficiar-se de mudanças na dinâmica global de oferta e demanda.
Fenómenos geopolíticos que impactam nos mercados globais e suas perspetivas
O conflito entre Rússia e Ucrânia gerou um impacto significativo no comércio internacional, especialmente no sector energético. A Rússia, sendo um dos principais produtores de petróleo e gás natural, viu suas exportações serem afectadas pelas sanções internacionais. As interrupções no
fornecimento de gás para a Europa resultaram em aumentos significativos nos preços de energia, levando a uma inflação global mais persistente do que o esperado.
Economias europeias, altamente dependentes da energia russa, foram forçadas a acelerar a transição para energias renováveis e a procurar novos fornecedores, criando um impacto de curto prazo nos custos de produção e na competitividade industrial. Também o isolamento económico da Rússia aumentou a volatilidade nos mercados de commodities como metais e minérios, essenciais para a produção global de tecnologia e infra-estrutura.
As consequências económicas da guerra, portanto, amplificaram as pressões inflacionárias e desaceleraram o crescimento global. O Banco Mundial alerta que, para 2025, as condições financeiras globais permanecerão restritivas, em parte devido aos efeitos prolongados da guerra.
Segundo publicação do Banco Mundial, o impacto da guerra também exacerbou as divergências regionais nas taxas de crescimento. As sanções e a fragmentação do comércio global obrigaram muitos países a reestruturar suas cadeias de suprimentos, com consequências distintas:
- Leste Asiático e Pacífico: A dependência de exportações de commodities energéticas da Rússia levará o crescimento a desacelerar para 4,8% em 2024 e 4,2% em 2025.
- Europa e Ásia Central: Fortemente impactadas pela crise energética, o crescimento deve cair para 3% em 2024 e moderar para 2,9% em 2025.
- América Latina e Caribe: Apesar de menos dependente do comércio russo, a região ainda sofrerá com o impacto da volatilidade nos preços das commodities e deve ver seu crescimento cair para 1,8% em 2024, subindo para 2,7% em 2025.
- Oriente Médio e África Setentrional: Impulsionada pelos altos preços do petróleo e pelo aumento da demanda global por energia, a região deverá crescer 2,8% em 2024 e 4,2% em 2025.
- África Subsaariana: Apesar das pressões globais, espera-se que o crescimento aumente para 3,5% em 2024 e 3,9% em 2025.
Até 2025, espera-se que essa volatilidade persista, especialmente com a possível extensão das sanções económicas e a continuidade do conflito, afectando o apetite para investimentos de longo prazo em regiões directamente impactadas pelas interrupções comerciais e energéticas.
Economistas como Arvind Subramanian prevêem que a Índia e os países do Sudeste Asiático desempenharão um papel cada vez mais importante no cenário global até 2025. A análise de Miotti complementa essa visão ao sugerir que esses países, menos dependentes de cadeias de valor longas e com uma forte base de produção local, podem se beneficiar dessa fase de Desglobalização 2.0.
O impacto da guerra entre Rússia e Ucrânia acelerou tendências de desglobalização, ampliando a necessidade de resiliência local e de cadeias de suprimentos mais robustas. A Desglobalização 2.0, conforme destaca Gustavo Miotti, ganha ainda mais força neste cenário de incertezas geopolíticas. Ao mesmo tempo, os efeitos económicos desse conflito se estenderão até 2025, gerando volatilidade nos mercados financeiros, instabilidade no sector energético e maiores desafios para o comércio global.
O futuro da economia global será moldado pela capacidade de adaptação das economias às novas realidades geopolíticas e pelas políticas que impulsionem a resiliência económica e a cooperação internacional. As regiões que conseguirem equilibrar o crescimento sustentável com a segurança económica estarão mais bem posicionadas para prosperar.
*Sandra Camelo, COO na TIS