Fundado em 2020 por Ana Cristina da Costa Cangombe, na fase da pandemia Covid-19, o projecto Beauty Through Vitiligo Angola surgiu com o objectivo de ajudar pessoas portadoras da doença, e começou a ganhar pernas em 2021.
Com vontade de querer ajudar todas as pessoas portadoras do vitiligo e aqueles com baixo autoestima, a angolana Ana Cristina da Costa Cangombe, que também é portadora da doença há 18 anos, nascida há 52 anos, criou o projecto completamente online “Beauty Through Vitiligo Angola”, que actualmente conta com mais de três mil seguidores e a “Associação de Vitilindos de Angola” (AVA).
O vitiligo é uma doença caracterizada pela perda da coloração da pele. As lesões formam-se devido à diminuição ou ausência de melanócitos (as células responsáveis pela formação da melanina, pigmento que dá cor à pele) nos locais afectados.
As causas da doença ainda não estão claramente estabelecidas, mas alterações ou traumas emocionais podem estar entre os factores que desencadeiam ou agravam a doença, num indivíduo que já tenha uma predisposição genética para desenvolver a mesma.
A doença é caracterizada por lesões cutâneas de hipopigmentação, ou seja, diminuição da cor, com manchas brancas de tamanho variável na pele.
“O vitiligo não é contagioso e não traz prejuízos à saúde física. No entanto, as lesões provocadas impactam significativamente na qualidade de vida e na autoestima do paciente. Nesses casos, o acompanhamento psicológico pode ser recomendado”, explicou à FORBES ÁFRICA LUSÓFONA, Ana Cristina Cangombe, mentora e idealizadora do projecto Beauty Through Vitiligo Angola.
A presidente e fundadora do projecto e da AVA, conta que começou a ter a doença há 18 anos com uma mancha no peito, neste caso a primeira e, inicialmente não sabia o que era. “Entretanto, quando apareceu a segunda mancha, resolvi ir a uma dermatologista e a dermatologista é que me diagnosticou que era vitiligo”, lembrou.
Segundo Ana, depois de algum tempo as manchas desapareceram, mas posteriormente voltaram a aparecer na zona do pescoço, e a mesma permaneceu durante 10 anos, até que em seguida um gatilho emocional acabou por agravar o estágio da doença.
“Sempre que surge alguma situação emocional, algum stress, ansiedade e tudo mais, agrava-se os sintomas e a tendência é aumentar as manchas no corpo. Se o emocional estiver estável, podemos manter a estabilidade da doença ou até regressão. Nós temos testemunhos de regressão, eu própria já tive regressão da doença”, afirmou a fundadora do projecto.
Sobre as mudanças que teve no corpo, Ana Cangombe, que tem 80% do corpo pigmentado, disse que não foi fácil ter que enfrentar a transformação exterior, ver o corpo a perder a sua coloração natural.
“E depois a doença aparece com manchas brancas em diferentes partes do corpo, no rosto foi mais difícil porque acho que o nosso rosto é a nossa identidade”, indicou.
Cangombe acrescentou que também não é fácil ter que lidar com o preconceito, a falta de conhecimento, os olhares críticos, de repugnação das pessoas por não saberem ao certo que tipo de doença é, se é contagioso ou não, essas foram situações que teve de gerir porque normalmente estas situações acabam por agravar o emocional da pessoa.
“Cheguei a desencadear depressão, idealizei suicídio duas vezes, mas graças a Deus consegui sobreviver a isso, porque Deus tem um propósito na verdade. E depois disso, foi quando comecei ainda no período de aceitação, a pensar em fazer alguma coisa para ajudar as pessoas que também tem a mesma doença e o projecto acabou por ajudar a mim mesma também. Daí ter surgido o projecto Beauty Through Vitiligo”, frisou.
A mentora do projecto informou que, a medida que o Beauty Through Vitiligo cresceu, mais pessoas começaram a ter acesso ao trabalho que fazia, através de seus testemunhos com imagem, episódio e mensagem que sempre publicava na página oficial do Instagram.
“Tudo que tivesse haver com a minha trajectória eu posta em forma de mensagem para todos os meus seguidores e membros do projecto e, isso fez com que outras pessoas que não tinham vitiligo, mas sofriam com preconceito de alguma forma despertassem e começassem a mandar-me mensagens”, enfatizou Ana.
Essas pessoas, acrescentou, começaram a enviar-lhe mensagens a pedir-lhe apoio para continuar a fazer o trabalho, porque estava a ajudar não só pessoas portadoras de vitiligo, mas outras com várias condições emocionais e, daí o projecto cresceu e começou a impactar vidas.
“O Beauty Through Vitiligo começou em Angola, mas depois começou a ter o feedback de outros países do mundo, em consequência do projecto, surgiu em 2022, a Associação Vitilindos de Angola (AVA), que já era uma ideia minha em criar uma associação para poder encontrar apoios de forma oficial”, contou a responsável da AVA.
De acordo com Ana, o projecto também tem conseguido estes apoios, mas precisavam de uma estrutura oficial que pudesse ir a busca das ajudas como, medicação, tratamento e acompanhamento psicológico.
Actualmente, segundo a fundadora da associação, já estão em nove províncias do país, como, Moxico, Huambo, Bié, Huíla, Namibe, Benguela, Luanda, Uíge e Cabinda, com 160 membros e todos portadores do vitiligo, desde crianças e a adultos.
No entanto, Cangombe referiu que a medicação para o tratamento do vitiligo não é barata e nem todos os portadores infelizmente, conseguem comprar neste caso os protetores solares por causa das condições de vida muito precária.
Explicou que conseguiram um grupo de parceiros voluntários que tiveram a apoiar alguns dos associados a fazerem consultas de terapia e dermatologia gratuitas, mas as iniciativas privadas não conseguem cobrir um leque muito grande. Entretanto, têm como maior objectivo encontrar do Estado angolano esses apoios.
Ana é uma mulher cheia de sonhos e realizações, apesar de ter enfrentado tantos desafios por causa da sua condição de saúde conseguiu impactar e transformar vidas.
“O número de vida que já impactei são tantas que até já perdi a conta, tenho muitos testemunhos de pessoas que consegui impactar suas vidas. Sinto-me orgulhosa e feliz por Deus ter me escolhido para este trabalho, não é fácil, mas cada testemunho é uma prova de que havia um propósito e este propósito está a ser cumprido”, sublinhou.
Por outro lado, Ana lamentou ainda uma situação que aconteceu recentemente com um portador de vitiligo.
“Recebi um testemunho e estou à espera que o rapaz me envie por escrito o testemunho de um portador de vitiligo que foi fazer um teste numa unidade militar para ingresso e, apesar de ter cumprido todos os requisitos, chegou alguém que lhe disse que por causa de ter aquelas manchas na pele não podia ser aceite. Então, ele não fez a inscrição por causa disso”, contou com um olhar triste.
“Cada testemunho de membro da associação que vem ter comigo para expor uma situação semelhante acaba por mexer comigo, porque de certa forma faz-me reviver situações que eu própria já passei. Já tinha um emprego. Graças a Deus não fui prejudicada e a nível do meu emprego não tenho razões de queixas, mas passei por situações. Muitas vezes, constrangedoras de pessoas que tinham receio de dar a mão, pessoas que não queriam encostar, pessoas que se riram da minha cara quando ainda tinha muitas manchas no rosto. Por mais que a gente aceita, a doença torna-se mais difícil aceitar esse preconceito”, revelou.

No entanto, em celebração ao Dia Mundial de Conscientização sobre o Vitiligo, a presidente da associação convida a sociedade a caminhar numa jornada por dignidade, inclusão e empatia.
“Somos diferentes na pele, mas iguais em direitos, sonhos e valores. Que cada passo dado seja um símbolo de amor-próprio, de luta contra o preconceito e de fortalecimento dos nossos associados em todo o país”, concluiu.