Transformar mentalidades com a força de um saxofone

Músico saxofonista de jazz, produtor, compositor e activista social, Moreira William Chonguiça, embora tenha nascido em Maputo, considera-se um cidadão do mundo por natureza, razão pela qual defende que Moçambique e África são uma parte da vila global. Não é, pois, em vão que o seu segundo álbum, lançado em 2007, tem como título “The…
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Nascido em Maputo, um dos mais proeminentes saxofonistas de jazz da África lusófona, Moreira Chonguiça, conta a Forbes como a música transformou-lhe numa marca com valor comercial e social.
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Músico saxofonista de jazz, produtor, compositor e activista social, Moreira William Chonguiça, embora tenha nascido em Maputo, considera-se um cidadão do mundo por natureza, razão pela qual defende que Moçambique e África são uma parte da vila global. Não é, pois, em vão que o seu segundo álbum, lançado em 2007, tem como título “The Moreira Project Vol. 2 – Citizen of the World”.

Em conversa com a FORBES ÁFRICA LUSÓFONA, o artista que Moçambique viu nascer há 46 anos garante ser “movido por causas, apaixonado pela humanidade, focalizado em objectivos, persistente quando a fé fraqueja e obcecado pela disciplina”.  

Moreira Chonguiça sempre sonhou em fazer Direito e exercer advocacia. Mas, quis o destino que se licenciasse em Música – performance em Jazz e especialização em Etnomusicologia, cum laude honours degree – pela Universidade de Cape Town, na África do Sul. “Por isso digo que sou um advogado frustrado e que a música me escolheu”, ironiza.

A sua entrada para o mundo da música acontece quando, com apenas sete anos de idade, os seus pais decidiram inscrevê-lo na Escola Nacional de Música, em Maputo, como uma actividade extracurricular, ou seja, para ocupá-lo depois das aulas do ensino primário. Chonguiça conta que, a dada altura, chegou mesmo a desistir da escola de música, tendo retomado cerca de dois anos mais tarde.

“Voltei a inscrever-me e terminei. Dali concorri para estudar Música na Universidade de Cape Town na África do Sul. Entretanto, em casa, o meu pai e tio escutavam música de vários artistas moçambicanos e estrangeiros e coleccionavam discos de vinil e arte diversa. Portanto, fui introduzido no mundo da música ainda em tenra idade”, recorda.

De forma quase subconsciente, Moreira Chonguiça iniciou a carreira profissional em Moçambique, actuando com grupos como Gorwane, Kawai K 10, Professor Orlando da Conceição, Grupo de Jazz de Maputo, entre outros. Mais tarde, após a sua graduação em cum laude honours degree pela Universidade de Cape Town, actua com algumas bandas sul-africanas, lideradas por músicos de renome como Judith Sephuma, Sibongile Khumalo, Loading Zone e Jaco Maria.

“Parto do princípio de que a arte é transversal. Eu vivo e exploro o máximo essa transversalidade que a arte permite”

Depois de fazer parte da banda do guitarrista Jimmy Dludlu, “C-Collective”, durante seis anos e de ter viajado pelo mundo como parte da celebração dos dez anos da democracia na África do Sul, decide criar a própria empresa, uma produtora e editora independente, a MoreStar Entertainment, e uma banda denominada “The Moreira Project”, seguindo a partir dali uma carreira a solo e uma estrada repleta de conquistas.

“A música proporcionou-me uma posição no mundo e na minha terra, como marca com valor comercial e social. A música conferiu-me uma posição que permitiu atrair outras marcas de empresas, instituições públicas e ONG’s dispostas a acrescentar valor nos seus serviços numa base de cooperação em que todos saímos a ganhar, de acordo com as causas que defendemos”, refere o saxofonista, para quem a cultura é um factor importante e incontornável nos programas, processos e projectos de desenvolvimento económico e social do mundo.

De acordo com Moreira, a música é tão relevante como qualquer outro produto que o ser humano possa consumir. Por exemplo, sustenta, através de uma parceria com o Ministério dos Recursos Minerais e Energia do seu país, em Novembro de 2021, participou na Coreia do Sul, província de Geoje – Samsung Industries, no maior evento global de apresentação da plataforma da empresa ENI, que pertence ao consórcio Mozambique Rovuma Venture (MRV), em que estiveram presente dois chefes de Estado, concretamente Filipe Nyusi, de Moçambique, e Moon Jae-in, da Coreia do Sul, além dos accionistas da MRV e da ENI.

Na ocasião, o músico fez aquilo o que se designa por sail away e entoou o hino de Moçambique, acompanhado pelo grupo da Orquestra Sinfónica Naval da Coreia do Sul, na partida da plataforma que chegou à pátria moçambicana em Janeiro de 2022.

Ainda por meio da parceria com o Ministério dos Recursos Minerais e Energia, a 18 de Junho de 2019, conceptualizou e produziu o musical designado “We are the world” que foi apresentado na Gala de anúncio e assinatura da Decisão Final de Investimento (FID) da Anadarko, na Área 1 do Projecto LNG – Gás Natural Liquefeito, no valor de 20 mil milhões de dólares, actualmente um investimento da Total Energies.

“Com a reinterpretação da música We are the world, de 45 minutos de duração, e com um elenco formado por cerca de 87 artistas jovens – dentre vocalistas, bailarinos e instrumentistas – pretendi criar uma montra de exposição onde estivesse reflectido, de forma contemporânea, a diversidade e o pluralismo, aspectos que caracterizam a cultura moçambicana. O enfoque foi para determinados aspectos que se evidenciam na rica diversidade cultural moçambicana: etnia, religião, língua, indumentária, juventude”, explica.

Apesar da grande visibilidade que o panorama musical lhe confere, em Moçambique e não só, Chonguiça diz que vive da arte no geral e não exclusivamente da música. “Parto do princípio de que a arte é transversal. Eu vivo e exploro o máximo essa transversalidade que a arte permite”, enfatiza.

“A procura da excelência é constante e requer disciplina, comprometimento e consistência”

Além da música, o também empresário se dedica a diplomacia cultural, educação, activismo social, filantropia e a criação de veículos sustentáveis para a indústria criativa e cultura em África, como fez questão de avançar à Forbes.

É, desde 2018, membro do Conselho Consultivo Internacional da Kenjin-Tatsujin (ASHINAGA), uma organização existente há mais de 50 anos com sede em Tokyo, no Japão, que apoia órfãos com bolsas de estudo à nível mundial. Por conta disto, viaja por vários países em que existam estudantes bolseiros da ASHINAGA para partilhar experiências e motivá-los. Em 2014, fundou o More Jazz Big Band, uma plataforma de jovens onde, para além de aperfeiçoarem a execução de instrumentos musicais, se discute sobre diversos temas, desde sonhos a carreiras profissionais.

Moreira Chonguiça é embaixador de marca da Volvo, do Radisson Blu Hotel and Residence, em Maputo, da Fatelli & Fatelli (Men’s Fashion in Luxury Business) e do grupo Entreposto. Nesta condição, [de embaixador] propõe estratégias e formas de maximizar o potencial das marcas, “de modo a satisfazer e ultrapassar a expectativa do cliente”. A par disto, é presidente do pelouro das Indústrias Criativas e Cultura na Confederação das Associações Económicas de Moçambique.

Considerado como um dos maiores saxofonistas moçambicano, o músico é patrono do Orfanato AACOSIDA – Associação dos Amigos de Crianças Órfãs de Sida e, nessa qualidade, colabora e troca experiências, desde 2005, com cerca de 79 crianças órfãs a viverem positivamente com HIV/Sida.

Enquanto músico, Chonguiça tem parcerias com várias instituições públicas e privadas. Segundo diz, as parcerias que mantém visam encontrar sinergias para alcançar melhores patamares. “A procura da excelência é constante e requer disciplina, comprometimento e consistência”, refere.

Através do Festival de Jazz de Maputo – More Jazz Series, o empreendedor mantém parcerias com o Ministério da Cultura e Turismo, Cervejas de Moçambique – Stella Artois, Grupo Engco, Entreposto Auto – Volvo Cars, Fatelli & Fatelli, Radisson Blu Hotel and Residence, Brithol Michcoma, Playground Moçambique, Bom Garfo Catering e Eventos, UNESCO, Chitara Sound, Rádio Moçambique, Grupo SOICO – STV, Marroquim & Macia Advogados.

O fundador da banda The Moreira Project, garante que em todas as parcerias que firma os ganhos têm sido mútuos. “O maior ganho, para além do aspecto financeiro ou material, é que juntos somos mais fortes”, considera, sustentando que “as marcas são feitas de pessoas com emoções e ideias com objectivos”. Assim, defende Chonguiça, para cada produto que juntos idealizam e lançam será ou é sempre mais forte, comercialmente e socialmente.

Chonguiça desvaloriza as conquistas financeiras e diz que a facturação nunca fará fé e nem vai reflectir os ganhos que tem. “O resultado e o impacto da nossa acção é imensurável”, remata.

Enquanto músico, a grande ambição de Moreira Chonguiça é poder colaborar com artistas de diferentes nações e culturas, assim como ganhar um Grammy. Lurdes Mutola, Nelson Mandela, Spike Lee, Oswald Boteng, Manu Dibango, Paulina Chiziane, Michael Jordan, Miles Davis e Cristiano Ronaldo, são apenas alguns dos vários ídolos do saxofonista, que tem como hobbies a leitura, investigação, ver filmes e prática de desporto, especificamente o ténis.

Foram vários os episódios que marcaram, até ao momento, de forma positiva a trajectoria musical do cantor, entre os quais Chonguiça destaca o facto de ter podido colaborar com Manu Dibango, a quem apelida de “Leão de África”.

Desempenho premiado

As acções desenvolvidas por Moreira Chonguiça têm merecido o reconhecimento, dentro e fora do país. A 7 de Dezembro de 2021, o embaixador do Japão em Moçambique outorgou ao activista o Diploma de Honra ao Mérito do Ministro dos Negócios Estrangeiros do Japão, pelo papel na melhoria de relações entre os dois países.

A 3 de Fevereiro de 2019 recebeu a medalha de “Mérito de Artes e Letras de Moçambique”, em cumprimento de decreto exarado pelo Presidente da República, Filipe Nyusi. Em Maio de 2016 foi condecorado com a “Ordem de Mérito” por Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente de português, por sua contribuição na música jazz em Moçambique.

Chonguiça foi três vezes vencedor de prémio no South African Music Award, em 2009, com o álbum “The Moreira Project:  VOL. 2Citizen of the World”, nas categorias Best Contemporary Jazz (Melhor Jazz Contemporâneo) e Best Album Packaging (Melhor Capa de Álbum), sendo que, em 2007, o álbum “The Moreira Project:  Vol. 1 – The Journey” venceu o prémio de Best Producer (Melhor Produtor).

O saxofonista partilha com a FORBES o significado que estas distinções têm para si. Em relação a medalha de “Mérito de Artes e Letras de Moçambique”, a condecoração com a “Ordem de Mérito” de Portugal e o Diploma de Honra ao Mérito do Ministro dos Negócios Estrangeiros do Japão, revela, mostram o impacto que a sua música tem em “criar novas tendências nas sociedades, influenciar as economias, desmistificar tabus e preconceitos na humanidade, bem como unir culturas”.

No que tem que ver com os prémios de carreira no South African Music Award, afirma, significa o reconhecimento pelas entidades máximas da indústria da música no mundo dos aspectos qualitativos relacionados ao conteúdo, produção, execução e apresentação.

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