Com grande capacidade de análise e habilidade de se adaptar à mudança, Sónia Silva é uma cidadã do mundo que, de forma intensa, procura preservar a sua identidade cultural, estimulado a paixão que diz ter pelo desenvolvimento pessoal e profissional de jovens e mulheres.
“Tenho a minha cultura africana muito presente, mas sei que profissionalmente sou muito mais britânica e americanizada na forma de trabalhar. Gosto de fazer as coisas como devem ser, com aquela eficácia, pois entendo que o tempo é dinheiro e que ter muita atenção é importante. Se me perguntasse como me classifico enquanto profissional, diria que sou uma líder transformacional muito carismática”, afirma, em conversa com a FORBES ÁFRICA LUSÓFONA.
Filha de pai guineense e mãe cabo-verdiana, mas nascida em Lisboa há 45 anos, Sónia é formada em Políticas Europeias pela Universidade de Leeds, na Inglaterra, e trabalha há mais de 18 anos na banca de investimento.
“Sou de origem guineense, mas estou fora há muito tempo. Resido no exterior há mais de 20 anos. Vivi 17 anos em Londres, onde fiz a minha formação académica e onde dei início à minha carreira profissional. Há sete anos mudei-me para os Estados Unidos da América. A minha paixão era ser advogada. Estava a estudar Direito em Portugal, mas depois o meu irmão mudou-se para Inglaterra, e nós somos muito próximos”, conta.
Mudou-se então para a Inglaterra, mas, como o curso de Direito que frequentava em Portugal “era muito diferente” do leccionado em ‘terras de sua majestade’, optou por fazer Políticas Europeias.
“O que eu tinha em mente era eventualmente trabalhar para as Nações Unidas, porque a minha mãe trabalhava para esta organização. Eu tinha esse sonho. Mudei de curso para Políticas Europeias e comecei a trabalhar num banco de retalho, na Inglaterra. Foi a partir daí que ganhei paixão pela banca”, indica. Foi ganhando, cada vez mais, gosto por finanças, até que se decidiu focar na banca de investimentos.
Sónia é uma executiva que já trabalhou em grandes bancos internacionais, onde exerceu cargos de liderança, tendo passagens em instituições como Standard Chartered Bank, JP Morgan, BNY Mellon, Royal Bank of Canada e GFI Brokers. A sua carreira começou em 2008 no BNY Mellon, instituição em que desempenhou a função de analista.
“Em 2009, no banco JP Morgan, assumi função de team leader de uma equipa de quatro pessoas. Pouco a pouco, fui vendo que sou boa nisso, porque eu digo sempre não é o saber fazer, não é só mostrar o caminho, mas é olhar para as pessoas e dizer que tu és capaz de fazer isto. Mas numa outra função, é ter esta capacidade de análise e olhar para o nosso capital humano. Portanto, para mim, foi assim que começou, e depois fui subindo de degrau e aumentando o número de pessoas sob a minha alçada”, recorda a jovem gestora, que na última função que desempenhou no Standard Chartered Bank chegou a liderar uma equipa de 70 pessoas de diversas nacionalidades.
“O meu dever como líder é criar um ambiente em que todos possam sentir-se incluídos, sentir que a sua voz conta e a sua forma de pensar também conta.”
Apesar de enfrentar alguns desafios, afirma que a sua abertura para ouvir os outros e o facto de ser muito empática ajudaram-na imenso a acreditar que um líder tem de ser uma pessoa que sabe ouvir e colocar-se no lugar do outro.
“O que eu faço sempre é não usar a mesma metodologia para lidar com o Pedro, com a Ana ou com a Maria, porque são todas pessoas diferentes, são seres humanos diferentes. Agora imagina culturas diferentes. Eu tinha pessoas na Polónia, na Índia, aqui nos Estados Unidos, Singapura e em Londres. O meu dever como líder é criar um ambiente em que todos possam sentir-se incluídos, sentir que a sua voz conta e a sua forma de pensar também conta. Foi esse papel que eu sempre desempenhei, mas não é uma coisa fácil. Tu, como líder, tens de ter consciência disso”, refere.
Há 16 anos na indústria financeira, Sónia Silva considera-se uma “esponja”, uma aprendiza contínua num ramo dominado por homens, levando consigo a sua habilidade de se adaptar ao novo, “valorizando a resiliência como uma valência que todos devem desenvolver, independentemente do ramo em que a pessoa trabalha”. Apesar de haver já muitas mulheres no sector financeiro a nível da CPLP, a especialista em finanças considera que ainda não estão em lugares de liderança.
“Por exemplo, estive numa conferência em Luanda, onde falei, e tinha vários painéis constituídos apenas por homens, incluindo o moderador, e aquilo deixou-me um bocado incomodada, o que me levou a questionar se não existiam mulheres em cargos de direcção”, indicou. No entender de Sónia, às mulheres têm sido dadas algumas responsabilidades de liderança, “mas, em termos de cargos de tomada de decisão, ainda falta um bocadinho, acontecendo o mesmo no Ocidente”.
Diz que, quando alcançou o cargo de directora executiva, era a única mulher negra na empresa, daí defender que os governos, assim como as instituições do sector privado, têm de desenvolver políticas de recrutamento para que as mulheres tenham oportunidades de demonstrar as suas valências, competências e experiências.
For Women by Women capacita jovens
Com o propósito de empoderar, capacitar mulheres, jovens e profissionais de diversos sectores, por via de mentoria, workshops, masterclasses e conferências, a filantropa e empreendedora social fundou, em 2020, a For Women by Women. Neste âmbito, colabora com o Governo da Guiné-Bissau, figuras de referência no país e com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no país, na realização de eventos nos seus eixos de actuação.
“A For Women by Women nasceu em 2020 de uma paixão pelo desenvolvimento pessoal e profissional das mulheres. Iniciámos com os PALOP, mas vamos eventualmente estender. Realizamos eventos presenciais e virtuais, abordando temas como comunicação efectiva, inteligência emocional, entre outros. Entendemos que são temas que ninguém nos ensina quando vamos à escola ou à universidade”, justifica.
Ao chegar a dois grandes centros financeiros, nomeadamente Londres e Nova Iorque, Sónia diz estar a servir o mundo, em termos de carreira, ao mesmo tempo praticando acções que ajudam o próximo. “E dou-lhe um exemplo concreto: eu tiro férias, não necessariamente para ir curtir uma praia. Vou à Guiné-Bissau para ir passar tempo com jovens universitários, para fazer uma feira de trabalho. Isso dá-me imenso prazer”, ressaltou.
Na visão desta mulher guineense, as pessoas poderiam ter um pouco mais de espírito de sacrifício, pois gostaria de ver um povo, uma nação, um PALOP com uma dimensão mais solidária, aperfeiçoando mais a vontade de dar e ensinar o outro. “Eu trago os que estão comigo, ou seja, eu não lidero porque quero estar à frente.”
“Normalmente, lidero porque sou líder, mas puxo sempre pelos que estão atrás ou ao lado”, garante. A juventude feminina lusófona, no seu entender, “precisa de acompanhamento, encorajamento, de espaço onde possa ser ela mesma e perceber que tem o seu lugar”.
Da banca a escrita
Sónia Silva é uma das Top 100 Female Leaders 2022 e em 2023 recebeu um prémio da Opportunities in Africa pelo seu trabalho na Guiné-Bissau no âmbito da For Women by Women.
Autora do livro de prosas e poemas Sublime Olhar da Paixão, publicado pela NIMBA Edições em 2020, Sónia revela: “Sempre gostei de escrever. A escrita é uma forma que temos de tirar cá para fora pessoas reservadas como eu. Hoje olham para a Sónia como uma pessoa confiante, mas nem sempre foi assim.”