Num país onde a maioria da população nasceu décadas depois da independência, o primeiro presidente de Angola, Agostinho Neto, que hoje nobremente celebramos, corre o risco de ser reduzido a uma figura de estátua, mais celebrada nos feriados do que compreendida no quotidiano. Esse é o desafio de Angola contemporânea: actualizar o seu herói, resgatando o valor das suas ideias no debate sobre o que significa liderar em tempos de transformação. Neto falava de esperança, de justiça social, de dignidade. O seu discurso pode soar distante, e para alguns até tocar a ladainha, mas engana-se quem assim pensa, tão pequenino.
O que mais precisamos hoje não é de repetir o hino de Neto, mas de aplicá-lo. É garantir que o petróleo não seja a prisão do futuro, que a juventude encontre oportunidades que dispensem a emigração, que a cultura não seja apenas memória, mas motor de identidade e progresso. O verdadeiro tributo a Neto não está nas praças que levam o seu nome, mas na coragem de fazer da política um serviço público, da liderança uma prática ética e da visão uma acção transformadora.
Três lições do herói nacional que se lê nas entrelinhas da sua vida, na análise dos seus actos, na poesia das suas palavras:
A primeira lição é a coragem. Neto arriscou a vida pela libertação do seu povo, sem garantias de vitória. Num tempo em que muitos líderes parecem hesitar entre o interesse coletivo e a conveniência pessoal, o exemplo de Agostinho Neto lembra-nos que liderança é, antes de tudo, assumir riscos em nome de uma visão.
A segunda é a visão humanista. Como médico e poeta, compreendia que o desenvolvimento de uma nação não se mede apenas por indicadores financeiros, mas na dignidade de cada cidadão. Aos líderes actuais, essa é talvez a mais urgente mensagem: crescimento económico sem inclusão social é uma vitória vazia.
A terceira é a capacidade de unir palavra e ação. Neto escreveu versos que se tornaram bandeiras, mas soube transformá-los em mobilização política. Hoje, num tempo saturado de discursos, essa coerência é um bem raro. Líderes que prometem mas não cumprem perdem credibilidade e, caros leitores, credibilidade é a moeda mais valiosa do poder.
Se Agostinho Neto foi herói do passado, cabe-nos torná-lo inspiração do futuro. E esse é talvez o maior teste à maturidade da Lusofonia de hoje: provar que a sua independência não foi apenas ato histórico, mas compromisso permanente. Esse sim, o legado de Neto para os netos do futuro.